segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Família Borges de Bom Jesus e suas origens açorianas (Parte I)




                                          Por Claudia Martins Borges Bastos do Carmo 


       Há 240 anos, em 21.01.1774, Francisco Lourenço Borges nascia na ilha Terceira, Açores.

       Quando embarcou para o Brasil, no final do séc. XVIII, ele nunca poderia imaginar que as tradições e a religiosidade profunda, cheia de encanto e de beleza, trazidas de sua terra, seriam herdadas e preservadas por seus descendentes em locais tão distantes como Bom Jesus do Itabapoana, RJ, dentre elas a devoção particular pelo Espírito Santo. 


Apresentação


   Neste texto apresentamos as pesquisas realizadas por Maria Cristina Borges, Claudia Martins Borges Bastos do Carmo e Antonio Soares Borges sobre a origem da família Borges de Bom Jesus do Itabapoana, RJ.
       As informações que sempre tivemos eram as contidas no livro "Bom Jesus do Itabapoana" do historiador Zico Camargo, que traz a genealogia da família Teixeira. Sabíamos que Ana Rosa Teixeira, uma dentre os dez filhos do mineiro Francisco Teixeira de Siqueira que vieram para nossa cidade foi casada com Francisco José Borges e aqui deixou grande descendência. 
    Quem foi Francisco José Borges? De onde veio? Essas foram as perguntas que nos levaram a essa pesquisa, que não é um trabalho pronto, podendo ser alterado de acordo com o surgimento de novos dados. 
   Iniciamos procurando informações sobre a família Borges nos registros paroquiais da Igreja Matriz de Bom Jesus do Itabapoana, o que nos levou ao registro de batismo do bisavô de Cristina, MESSIAS, surgindo assim a primeira “pista”: o nome do nosso “avô” açoriano Francisco Lourenço Borges. 

Registro de Batismo de Messias José Borges. Fonte: Registro Paroquial de Bom Jesus do Itabapoana, RJ
    


             "Aos seis dias do mês de janeiro de mil oitocentos e setenta e dois, nesta Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana, batizei e pus os santos óleos ao inocente Messias, branco, nascido em dezembro último, filho legítimo de Francisco José Borges e Maria Carolina Borges; neto paterno de Francisco Lourenço Borges e Anna Rosa de Jesus; e materno de Anacleto Elias de Oliveira e Francisca de tal; foram padrinhos Antonio Teixeira de Siqueira e sua mulher Maria Joaquina da Silva; do que mandei lavrar este assento que assinei. Vigrº José Guedes Machado.”




   Com a informação contida no registro de Messias, fomos em busca de dados sobre Francisco Lourenço Borges e chegamos à origem açoriana da família, através do site “Projeto Compartilhar”, trabalho de Bartyra Sette.




1. FRANCISCO LOURENÇO BORGES - AÇORES       

                                 

   
  Foi na Ilha Terceira, freguesia de São Miguel Arcanjo das Lajes, bispado de Angra do Heroísmo, arquipélago dos Açores, que nasceu e foi batizado Francisco Lourenço Borges aos 21/01/1774, sendo filho de Antonio Vieira de Andrada e Joana Antonia. Na fotografia abaixo, o registro de batismo de Francisco Lourenço Borges, localizado pelo primo Antonio Soares Borges na biblioteca digital disponibilizada pelo Centro de Conhecimento dos Açores.

Registro do nascimento de Francisco Lourenço Borges. Pesquisa: Antonio Soares Borges. 
Fonte: Centro de Conhecimento dos Açores – Biblioteca Digital – Lajes, Baptismos, 1751-1769 > 0141
                             

      "Francisco , filho de Antonio Vieira de Andrada, natural desta freguesia das Lages, e de sua mulher Joanna, natural da freg. das Quatro Ribeiras e fregueses desta Paroquia de Arcanjo de São Miguel nasceu aos vinte e um dias do mês de Janeiro do presente ano de mil setecentos e setenta e quatro, foi batizado nesta Paróquia d por mim, Manoel da Costa, Vigário desta, aos vinte e nove dias do mesmo mes e ano,foram padrinhos Francisco Vieira de Andrada e sua mulher D. Maria Nascimento, fregueses desta Paróquia, José e para constar fiz esse termo que assinei com testemunhas no mesmo dia, mês e ano.                 Manoel da Costa, Vigário"



       Antonio localizou também dois irmãos de Francisco nos Açores: Manoel, nascido em 28/01/1757 e Thomazia, nascida em 27/09/1770.


 2. VINDA PARA O BRASIL


Não sabemos a data em que emigrou, mas deve ter vindo bem jovem, seguindo rumo a Minas Gerais, onde se dedicou ao trabalho com tropas de carga. Transportava gêneros para abastecer o Rio de Janeiro e voltava com produtos necessários aos mineiros. Aos 16 anos, em 08/01/1790, atravessou cargas de sal no Registro de Mantiqueira, conforme consta no Arquivo Público Mineiro.

      Pintura "Tropa de cargas", de Rugendas

           Muitos outros produtos, dentre eles produtos de farmácia, eram trazidos do Rio de Janeiro por Francisco, que os revendia em seu comércio de secos e molhados, como vemos na dissertação “Entre lojas e boticas: o comércio de remédios entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais (1750-1808)”, apresentada por Danielle Sanches de Almeida: "Esse mercador comprava gêneros de botica, no Rio de Janeiro, de Antonio Roiz de Carvalho, João Viana Gomes, Gaspar Barbosa Lima entre outros, para vender em sua loja de secos e molhados."
Trecho de "Entre lojas e boticas: o comércio de remédios entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais (1750-1808)”, de Danielle Sanches de Almeida


 

            Francisco também comerciava escravos no Rio de Janeiro. Fábio W.A. Pinheiro, em sua dissertação de mestrado em História na UFRJ, citou Francisco Lourenço Borges como um dos comerciantes de escravos responsáveis por grandes remessas (acima de 20 escravos) do Rio de Janeiro para Minas Gerais, entre 1809 - 1830. 
             Em 25 de abril de 1798, aos 24 anos, Francisco Lourenço Borges casou-se na Capela da Ressaca, Prados, MG, com Ana Rosa de Jesus, mineira, natural de Prados, filha do Alferes Bento José Pereira e Tereza Umbelina de Jesus. Um dos irmãos de Ana, Manoel José Pereira, casou-se com Ermelinda Rodrigues da Conceição, considerada a fundadora da cidade de Miracema, RJ.                                                              

Certidão de casamento de Francisco Lourenço Borges e Anna Roza de Jesus



              “Ressaca – Francº Lourenço Borges – Ana Roza de Jesus 

             Aos vinte cinco dias do mês de Abril de mil sete centos noventa, e oito annos, na Capella da Ressaca, filial desta Matriz de Prados, feitas as denunciaçõens na forma do Sagrado Concilio Tridentino, constituição, e precedendo provisão de habilitação do muito Reverendo Doutor Pedro Joze Pereira de Castro, Vigario da vara desta comarca, que fica em meu poder, de Licença minha, na presença do Reverendo Severino Jose da Silva Moura, e das testemunhas assignadas na certidão por palavras de prezente et in facie Eclesia Francisco Lourenço Borges filho Legitimo de Antonio Vieira de Andrade e Joanna Antonia, natural, baptizado na freguesia de Sam Miguel Arcanjo, ilha Terceira, Bispado de Amgra; e Anna Roza de Jesus filha Legitima de Alferes Bento Jose Pereira, e Thereza Umbelina de Jesus, natural, e baptizada nesta sobredita freguesia de Prados, e logo lhes deo as bênçõens nupciais na forma do Ritual Romano e para constar mandei fazer este assento, que assignei era ut supra. O Vigrº Jose Glz Torrez”.


          Em 1805, sete anos após o casamento, Francisco Lourenço Borges comprou, de Agostinho Homem da Costa e sua mulher Rosa Dias de Jesus, a Fazenda do Ribeirão, junto ao rio Paraopeba, na Aplicação de São Caetano de Paraopeba, filial de N. Sra. da Conceição da Real Vila de Queluz (atual Conselheiro Lafaiete), Comarca do Rio das Mortes. Essa fazenda anteriormente havia pertencido ao Alferes Cristóvão Dias Gonçalves, e tinha como limites as terras do capitão Benedito Dornelas da Costa e Manoel Francisco da Costa. 
Fonte: Síntese de Cartas de Sesmarias e Anotações pessoais de Joaquim Rodrigues de Almeida, em Biblioteca Antonio Perdigão, Museu e Arquivo da Cidade de Conselheiro Lafaiete.

Rio Paraopeba
 Fonte: Wikipedia







             Em seu testamento, Francisco Lourenço Borges declarou ser membro da Irmandade do Santíssimo Sacramento (importante agremiação religiosa que reunia em seu quadro a elite local), da Irmandade do Senhor de Matosinhos (celebração da festa anual ao Bom Jesus em Agosto, entre os dias 1 e 15) e da Irmandade da Senhora da Boa Morte, em Barbacena, da qual era membro remido.
               Francisco Lourenço Borges também foi Vereador da Câmara de Queluz.  Em 26.02.1823 ele e seus colegas mandaram riscar a cláusula de juramento prévio da Constituição pelo Príncipe D. Pedro I, inserida a pedido do Senado da Côrte. Reconhecendo ter sido um erro declararam que  “de nenhuma sorte deve ter logar a cláusula de semelhante juramento, que de sua natureza he nulo, devendo ser riscada em todos os logares onde se tivesse escrito, havendo como nunca proferida” (Fonte: Jornal Império do Brasil, em 29/03/1823).
Trecho do Jornal Império do Brasil, de 29/03/1823


           Em 02 de Maio de 1824, Francisco Lourenço Borges fez testamento de seus bens, registrando que estava "bastantemente enfermo de cama e de pé". Faleceu logo depois, em 13 de Maio de 1824, com apenas 50 anos, na Fazenda do Ribeirão, de sua propriedade.
       O testamento está disponível na internet através do Projeto Compartilhar:



3. DESCENDÊNCIA  

        Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de Jesus, conforme descrito no testamento dele, foram pais de: 

1. Francisco Lourenço Borges *
2. Francisca de Paula de Jesus, casada com João Lourenço Borges;
3. Maria Teresa Umbelina, casada com Francisco Antonio dos Santos;
4. Ana Querubina de Jesus, casada com Antonio Luiz da Cunha;
5. Theresa Umbelina de Jesus, casada com José Ferreira de Sousa Jr.;
6. Antonia (Pulcheria) de Jesus, casada com João Ferreira de Sousa;
7. Vicência Teresa de Jesus, casada com Joaquim Ferreira de Sousa;
8. Mafalda Antonia de Jesus;
9. Messias Umbelina de Jesus, casada com André Ferreira de Sousa;
10. Cândida Umbelina de Jesus, casada com Gervásio Ferreira de Sousa.

      * É muito comum, em registros antigos, haver divergência nos sobrenomes. Francisco Lourenço Borges e Francisco José Borges são, pelos documentos que localizamos, a mesma pessoa.


4. FAMILIA BORGES E SUA LIGAÇÃO COM A FAMILIA DE TIRADENTES
              Essa relação deve-se ao casamento de FRANCISCO JOSÉ BORGES, filho de Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de Jesus, com GERTRUDES JOAQUINA DA SILVA, filha do Cap. José Ferreira de Souza e Vicência Joaquina da Silva. Neta paterna do Cel. Francisco José Ferreira de Sousa e ANTONIA RITA DE JESUS XAVIER, irmã mais nova do Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Neta materna do Cap. André Rodrigues Chaves e Gertrudes Joaquina da Silva. 
         As famílias de Francisco Lourenço Borges e do Cap. José Ferreira de Sousa (relação acima) tinham forte ligação, pois 6 (seis) irmãos Borges se casaram com irmãos Ferreira de Sousa.

5. FRANCISCO JOSÉ BORGES


Batismo de Francisco José Borges

        Francisco José Borges foi batizado em 9 de Junho de 1806, na Capela de Santo Amaro, filial da Matriz de N. Sra. da Conceição da Real Vila de Queluz (atual Conselheiro Lafaiete), MG, pelo Padre Gregório João da Cruz. Foram seus padrinhos Domingos da Cunha Lopes e sua mulher Ana Joaquina Diniz.

                                                                                              
                   

         O Registro de Batismo de Francisco José Borges está guardado no Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Mariana - Livro de Batismo Período 1794 - 1829 - Livro I 14 - Pág. 236, Conselheiro Lafaiete, como segue:

        "Aos nove de Junho de anno de mil oito Centos, e Seis na Capella de Santo Amaro, filial desta Matris de Nossa Senhora da conceipçam da Real Villa de Quelus o Capellam da mesma Gregorio João da Cruz baptizou e poz os Santos Óleos a Francisco párvolo filho legítimo de Francisco Lourenço Borges e Anna Rosa de Jesus. Foram padrinhos Domingos da Cunha Lopes, e sua mulher Anna Joaquinna Dinis todos desta Freguezia.  Para constar fis este assento, que assigno. O Vigrº Fortunato Gomes Carnrº."
         Casou-se com 20 anos de idade na Ermida das Dores de Aplicação dos Olhos d’Água, Queluz (atual Conselheiro Lafaiete, MG), em 16 de outubro de 1826 com GERTRUDES JOAQUINA DA SILVA, filha do Cap. José Ferreira de Sousa e Vicência Joaquina da Silva. Assistiu-os o Padre Gonçalo Ferreira da Fonseca, em cuja Fazenda refugiou-se o Cônego Antonio Marinho, historiador da Revolução Liberal de 1842.
          Foram testemunhas do casamento: Silvério José Pereira e Domingos da Cunha Lopes.

Registro de casamento de Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da Silva.
Fonte: Registros paroquiais de Conselheiro Lafaiete, disponível em 
familysearch.com
                                            Pesquisa: Maria Cristina Borges

       
          O Registro de Casamento de Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da Silva está guardado no Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Mariana - Livro de Casamento Período 1824 - 1883 - Livro I 20 - Pág. 150v, Conselheiro Lafaiete, como segue:
      “Aos dezesseis de outubro de mil oitocentos e vinte e seis na Ermida das Dores de Aplicação dos Olhos d’Água com Provisão do Juizo Eclesiástico de São João, feitas as denunciações canônicas com licença minha, o Padre Gonçalo Ferreira da Fonseca assistiu e administrou o Sacramento do Matrimônio e conferiu as bênçãos nupciais na forma do Ritual romano aos contraentes Francisco José Borges, filho legítimo de Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de Jesus, e Dona Gertrudes Joaquina da Silva, filha legítima de do Capitão José Ferreira Souza e Dona Vicência Joaquina da Silva, naturais batizados e moradores nesta freguesia de Queluz, os quais com palavras de presente, mútuo consentimento, et in face Eclesio manifestarão sua vontade em presença das testemunhas Domingos da Cunha Lopes e Silvério José Pereira, assinados no assento feito pelo sobredito Padre, donde extraí a presença que assino."
6. DESCENDÊNCIA
   
       
 De acordo com pesquisas feitas em Mariana, MG e Bom Jesus, RJ, Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da Silva foram pais de, pelo menos:
1. Antonio José Borges, casado com Bárbara Rosa Teixeira;
2.  Maria Joaquina da Silva, casada com Antonio Teixeira de Siqueira;
3. Pedro José Borges, casado com Maria Rosa de Nazareth;
4. Ana Joaquina da Silva, casada com Francisco Theodoro de Oliveira; 
5. Messias Joaquina da Silva, casada com Antonio Rodrigues de Sousa;
6.  Francisco José Borges;
7. Verônica Joaquina da Silva, casada com Gervásio Ferreira de Sousa.
            Quando Francisco José Borges, já viúvo, e novamente casado com Ana Rosa Teixeira, veio para Bom Jesus do Itabapoana, RJ, alguns dos filhos do primeiro casamento vieram acompanhando o pai e aqui se fixaram, formando famílias tradicionais em todo o Vale do Itabapoana, com grande descendência. Alguns deles, como Antonio José Borges e Maria Joaquina da Silva, têm sua genealogia descrita no livro de Zico Camargo.

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