Há 240 anos, em 21.01.1774, Francisco Lourenço Borges nascia na ilha Terceira, Açores.
Quando embarcou para o Brasil, no final do séc. XVIII, ele nunca
poderia imaginar que as tradições e
a religiosidade profunda, cheia de encanto e de beleza, trazidas de sua
terra, seriam herdadas e preservadas por seus descendentes em locais tão
distantes como Bom Jesus do Itabapoana, RJ, dentre elas a devoção
particular pelo Espírito Santo.
Apresentação
Neste texto apresentamos as pesquisas realizadas por Maria Cristina Borges, Claudia Martins Borges Bastos do Carmo e Antonio
Soares Borges sobre a origem da família Borges de Bom Jesus do Itabapoana, RJ.
As informações que sempre tivemos eram as contidas no livro "Bom Jesus do Itabapoana" do historiador Zico Camargo,
que traz a genealogia da família Teixeira. Sabíamos que Ana Rosa Teixeira, uma dentre os dez filhos do mineiro Francisco Teixeira de Siqueira que vieram para nossa cidade foi
casada com Francisco José Borges e aqui deixou grande descendência.
Quem foi Francisco José Borges? De onde veio? Essas foram as
perguntas que nos levaram a essa pesquisa, que não é um trabalho pronto,
podendo ser alterado de acordo
com o surgimento de novos dados.
Iniciamos procurando informações sobre a família Borges nos registros
paroquiais da Igreja Matriz de Bom Jesus do Itabapoana, o que nos levou
ao registro de batismo do
bisavô de Cristina, MESSIAS, surgindo assim a primeira “pista”: o nome
do nosso “avô” açoriano Francisco Lourenço Borges.
Registro de Batismo de Messias José Borges. Fonte: Registro Paroquial de Bom Jesus do Itabapoana, RJ |
"Aos seis dias do mês de janeiro de mil oitocentos e setenta e dois,
nesta Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana,
batizei e pus os santos óleos ao inocente Messias, branco, nascido em
dezembro último, filho legítimo de Francisco José Borges e Maria
Carolina Borges; neto paterno de Francisco Lourenço Borges
e Anna Rosa de Jesus; e materno de Anacleto Elias de Oliveira e Francisca de tal; foram padrinhos Antonio Teixeira de Siqueira e sua
mulher Maria Joaquina da Silva; do que mandei lavrar este assento que assinei. Vigrº José Guedes Machado.”
Com a informação contida no registro de Messias, fomos em busca de
dados sobre Francisco Lourenço Borges e chegamos à origem açoriana da
família, através do site “Projeto
Compartilhar”, trabalho de Bartyra Sette.
1. FRANCISCO LOURENÇO BORGES - AÇORES
Foi na Ilha Terceira, freguesia de São Miguel Arcanjo das Lajes, bispado de Angra do Heroísmo, arquipélago dos Açores, que
nasceu e foi batizado Francisco Lourenço Borges aos
21/01/1774, sendo filho de Antonio Vieira de Andrada e Joana Antonia. Na
fotografia abaixo, o registro de batismo de Francisco Lourenço
Borges, localizado pelo primo Antonio Soares Borges na biblioteca digital disponibilizada pelo Centro de Conhecimento dos Açores.
Registro do nascimento de Francisco Lourenço Borges. Pesquisa: Antonio Soares Borges.
Fonte: Centro de Conhecimento dos Açores – Biblioteca Digital – Lajes, Baptismos, 1751-1769 > 0141 |
"Francisco , filho de Antonio Vieira de Andrada, natural desta
freguesia das Lages, e de sua mulher Joanna, natural da freg.
das Quatro Ribeiras e fregueses desta Paroquia de Arcanjo de São Miguel
nasceu aos vinte e um dias do mês de Janeiro do presente ano de mil
setecentos e setenta e quatro, foi batizado nesta Paróquia d por mim,
Manoel da Costa, Vigário desta, aos vinte e nove
dias do mesmo mes e ano,foram padrinhos Francisco Vieira de Andrada e
sua mulher D. Maria Nascimento, fregueses desta Paróquia, José e para
constar fiz esse termo que assinei com testemunhas no mesmo dia, mês e
ano. Manoel
da Costa, Vigário"
Antonio localizou também dois irmãos de Francisco nos Açores:
Manoel, nascido em 28/01/1757 e Thomazia, nascida em 27/09/1770.
2.
VINDA PARA O BRASIL
Não
sabemos a data em que emigrou, mas deve ter vindo bem jovem, seguindo
rumo a Minas Gerais, onde se dedicou ao trabalho
com tropas de carga. Transportava gêneros para abastecer o Rio de
Janeiro e voltava com produtos necessários aos mineiros. Aos 16 anos, em
08/01/1790, atravessou cargas de sal no Registro de Mantiqueira,
conforme consta no Arquivo Público Mineiro.
Muitos outros produtos, dentre eles produtos de farmácia, eram
trazidos do Rio de Janeiro por Francisco, que os revendia em
seu comércio de secos e molhados, como vemos na dissertação “Entre lojas
e boticas: o comércio de remédios entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais
(1750-1808)”, apresentada por Danielle Sanches de Almeida: "Esse
mercador
comprava gêneros de botica, no Rio de Janeiro, de Antonio Roiz de
Carvalho, João Viana Gomes, Gaspar Barbosa Lima entre outros, para
vender em sua loja de secos e molhados."
Francisco também comerciava escravos no Rio de Janeiro. Fábio
W.A. Pinheiro, em sua dissertação de mestrado em História na
UFRJ, citou Francisco Lourenço Borges como um dos comerciantes de
escravos responsáveis por grandes remessas (acima de 20 escravos) do Rio
de Janeiro para Minas Gerais, entre 1809 - 1830.
Em 25 de abril de 1798, aos 24 anos, Francisco Lourenço Borges casou-se na Capela da Ressaca, Prados, MG, com Ana
Rosa de Jesus,
mineira, natural de Prados, filha do Alferes Bento José Pereira e
Tereza Umbelina de Jesus. Um dos irmãos de Ana, Manoel José Pereira,
casou-se com Ermelinda
Rodrigues da Conceição, considerada a fundadora da cidade de Miracema,
RJ.
Certidão de casamento de Francisco Lourenço Borges e Anna Roza de Jesus |
“Ressaca – Francº Lourenço Borges – Ana Roza de Jesus
Aos vinte cinco dias do mês de Abril de mil sete centos
noventa, e oito annos, na Capella da Ressaca, filial desta Matriz
de Prados, feitas as denunciaçõens na forma do Sagrado Concilio
Tridentino, constituição, e precedendo provisão de habilitação do muito
Reverendo Doutor Pedro Joze Pereira de Castro, Vigario da vara desta
comarca, que fica em meu poder, de Licença minha, na
presença do Reverendo Severino Jose da Silva Moura, e das testemunhas
assignadas na certidão por palavras de prezente et in facie Eclesia
Francisco Lourenço Borges filho Legitimo de Antonio Vieira de Andrade e
Joanna Antonia, natural, baptizado na freguesia
de Sam Miguel Arcanjo, ilha Terceira, Bispado de Amgra; e Anna Roza de
Jesus filha Legitima de Alferes Bento Jose Pereira, e Thereza Umbelina
de Jesus, natural, e baptizada nesta sobredita freguesia de Prados, e
logo lhes deo as bênçõens nupciais na forma do
Ritual Romano e para constar mandei fazer este assento, que assignei era
ut supra. O Vigrº Jose Glz Torrez”.
Em
1805, sete anos após o casamento, Francisco Lourenço Borges comprou,
de Agostinho Homem da Costa e sua mulher Rosa Dias de Jesus, a Fazenda
do Ribeirão, junto ao rio Paraopeba, na Aplicação de São Caetano de
Paraopeba, filial de N. Sra. da Conceição da Real Vila de Queluz (atual
Conselheiro Lafaiete), Comarca do Rio das Mortes. Essa
fazenda
anteriormente havia pertencido ao Alferes Cristóvão Dias Gonçalves, e
tinha como limites as terras do capitão Benedito Dornelas da Costa e
Manoel Francisco da Costa.
Fonte:
Síntese de Cartas de Sesmarias e Anotações pessoais de Joaquim
Rodrigues de Almeida, em Biblioteca Antonio Perdigão, Museu e
Arquivo da Cidade de Conselheiro Lafaiete.
Rio Paraopeba Fonte: Wikipedia |
Em seu testamento, Francisco Lourenço Borges declarou ser membro
da Irmandade do Santíssimo Sacramento (importante agremiação religiosa
que reunia em seu quadro a elite local), da Irmandade do Senhor de
Matosinhos (celebração da festa anual ao Bom Jesus em Agosto, entre os
dias 1 e 15) e da Irmandade da Senhora da Boa Morte,
em Barbacena, da qual era membro remido.
Francisco
Lourenço Borges também foi Vereador da Câmara de Queluz.
Em 26.02.1823 ele e seus colegas mandaram riscar a cláusula de juramento
prévio da Constituição pelo Príncipe D. Pedro I, inserida a pedido do
Senado da Côrte. Reconhecendo ter sido um erro declararam que “de
nenhuma
sorte deve ter logar a cláusula de semelhante juramento, que de sua
natureza he nulo, devendo ser riscada em todos os logares onde se
tivesse escrito, havendo como nunca proferida” (Fonte: Jornal Império do
Brasil, em 29/03/1823).
Trecho do Jornal Império do Brasil, de 29/03/1823 |
Em 02 de Maio de 1824, Francisco Lourenço Borges fez testamento de
seus bens, registrando que estava "bastantemente enfermo de cama e de pé". Faleceu logo depois, em 13 de Maio de 1824, com apenas 50 anos, na Fazenda
do Ribeirão, de sua propriedade.
O testamento está disponível na internet através do Projeto Compartilhar:
3. DESCENDÊNCIA
Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de Jesus, conforme descrito no
testamento dele, foram pais de:
1. Francisco Lourenço Borges *
2. Francisca de Paula de Jesus, casada com João Lourenço Borges;
3. Maria Teresa Umbelina, casada com Francisco Antonio dos Santos;
4. Ana Querubina de Jesus, casada com Antonio Luiz da Cunha;
5. Theresa Umbelina de Jesus, casada com José Ferreira de Sousa Jr.;
6. Antonia (Pulcheria) de Jesus, casada com João Ferreira de Sousa;
7. Vicência Teresa de Jesus, casada com Joaquim Ferreira de Sousa;
8. Mafalda Antonia de Jesus;
9. Messias Umbelina de Jesus, casada com André Ferreira de Sousa;
10. Cândida Umbelina de Jesus, casada com Gervásio Ferreira de Sousa.
* É
muito
comum, em registros antigos, haver divergência nos sobrenomes. Francisco
Lourenço Borges e Francisco José Borges são, pelos documentos que
localizamos, a mesma pessoa.
4. FAMILIA BORGES E SUA LIGAÇÃO COM A FAMILIA DE TIRADENTES
Essa relação deve-se ao casamento de FRANCISCO
JOSÉ BORGES, filho
de Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de Jesus, com GERTRUDES JOAQUINA DA SILVA, filha do Cap. José Ferreira de Souza e Vicência Joaquina da
Silva. Neta paterna do Cel. Francisco José Ferreira de Sousa e ANTONIA RITA DE JESUS XAVIER,
irmã mais nova do Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o
Tiradentes. Neta materna do Cap. André Rodrigues Chaves e Gertrudes
Joaquina da Silva.
As
famílias de Francisco Lourenço Borges e do Cap. José Ferreira de Sousa
(relação acima) tinham forte ligação, pois 6 (seis) irmãos Borges se
casaram com
irmãos Ferreira de Sousa.
Francisco José Borges foi batizado em 9 de Junho de 1806, na Capela
de Santo Amaro, filial da Matriz de N. Sra. da Conceição da Real Vila de
Queluz (atual Conselheiro Lafaiete), MG, pelo Padre Gregório João da
Cruz. Foram seus padrinhos Domingos da Cunha Lopes e sua mulher Ana
Joaquina Diniz.
O
Registro de Batismo de Francisco José Borges está guardado no Arquivo
da Cúria Arquidiocesana de Mariana - Livro de Batismo Período 1794 -
1829 - Livro I 14 - Pág. 236, Conselheiro Lafaiete, como segue:
"Aos
nove de Junho de anno de mil oito Centos, e Seis na Capella de Santo
Amaro, filial
desta Matris de Nossa Senhora da conceipçam da Real Villa de Quelus o
Capellam da mesma Gregorio João da Cruz baptizou e poz os Santos Óleos
a Francisco párvolo
filho legítimo de Francisco Lourenço Borges e Anna Rosa de Jesus.
Foram padrinhos Domingos da Cunha Lopes, e sua mulher Anna Joaquinna
Dinis todos desta Freguezia. Para constar fis este assento, que
assigno. O Vigrº Fortunato Gomes Carnrº."
Casou-se com 20 anos de idade na
Ermida das Dores de Aplicação dos Olhos d’Água, Queluz (atual Conselheiro Lafaiete, MG), em 16 de outubro de 1826 com GERTRUDES JOAQUINA DA SILVA,
filha
do Cap. José Ferreira de Sousa e Vicência Joaquina da Silva. Assistiu-os
o Padre Gonçalo Ferreira da Fonseca, em cuja Fazenda refugiou-se o
Cônego Antonio Marinho, historiador da Revolução Liberal de 1842.
Foram testemunhas do casamento: Silvério José Pereira e Domingos da
Cunha Lopes.
Registro de casamento de Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da Silva.
Pesquisa: Maria Cristina BorgesFonte: Registros paroquiais de Conselheiro Lafaiete, disponível em familysearch.com |
O
Registro de Casamento de Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da
Silva está guardado no Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Mariana -
Livro de Casamento
Período 1824 - 1883 - Livro I 20 - Pág. 150v, Conselheiro Lafaiete, como
segue:
“Aos dezesseis de outubro de mil oitocentos e vinte e seis na
Ermida das Dores de Aplicação dos Olhos d’Água com Provisão do Juizo
Eclesiástico de São João, feitas as denunciações canônicas com licença
minha, o Padre Gonçalo
Ferreira
da Fonseca assistiu e administrou o Sacramento do Matrimônio e conferiu
as bênçãos nupciais na forma do Ritual romano aos contraentes Francisco
José Borges, filho legítimo de Francisco Lourenço Borges e Ana Rosa de
Jesus, e Dona Gertrudes Joaquina
da Silva, filha legítima de do Capitão José Ferreira Souza e Dona
Vicência Joaquina da Silva, naturais batizados e moradores nesta
freguesia de Queluz, os quais com palavras de presente, mútuo
consentimento, et in face Eclesio manifestarão sua vontade em presença
das testemunhas Domingos da Cunha Lopes e Silvério José Pereira,
assinados no assento feito pelo sobredito Padre, donde extraí a presença
que assino."
6. DESCENDÊNCIA
De acordo com pesquisas feitas em Mariana, MG e Bom Jesus, RJ, Francisco José Borges e Gertrudes Joaquina da Silva foram pais de, pelo menos:
1. Antonio José Borges, casado com Bárbara Rosa Teixeira;
2. Maria Joaquina da Silva, casada com Antonio Teixeira de Siqueira;
3. Pedro José Borges, casado com Maria Rosa de Nazareth;
4. Ana Joaquina da Silva, casada com Francisco Theodoro de Oliveira;
5. Messias Joaquina da Silva, casada com Antonio Rodrigues de Sousa;
6. Francisco José Borges;
7. Verônica Joaquina da Silva, casada com Gervásio Ferreira de Sousa.
Quando
Francisco José Borges, já viúvo, e novamente casado com Ana
Rosa Teixeira, veio para Bom Jesus do Itabapoana, RJ, alguns dos filhos
do primeiro casamento vieram acompanhando o pai e aqui se fixaram,
formando famílias tradicionais em todo o Vale do Itabapoana, com grande
descendência. Alguns deles, como Antonio José
Borges e Maria Joaquina da Silva, têm sua genealogia descrita no livro
de Zico Camargo.
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