Octacílio de Aquino
Sempre notei um traço de grande superioridade em todas as pessoas que me
encorajaram, material ou moralmente, nas lutas acadêmicas. Por isto meu pai
revelou-se-me, desde muito cedo, uma inteligência viva, um caráter inflexível,
um ânimo de fé inquebrantável e, sobretudo, a consciência mais completa que
ainda conheci.
Desde cedo também tive esses mesmos
pensamentos e sentimentos em relação à minha avó materna Maria Luiza de Saltes
Machado, o coração mais capaz de afetos que se possa imaginar, a de quem é
lícito dizer o que já se disse de uma famosa mulher - é um homem de bem!
Toda a gente que me conhece sabe o que
representa para a minha vida a fase do meu mundo intelectual que vai do b-a-ba
à colação de grau em Direito. Foram anos de trabalhos formidáveis, meus e dos
meus, trabalhos sem hesitações que me deram no seio augusto do meu povo
contemporâneo, a glória invejável de precursor nos estudos em nossa cidade.
Enquanto outros, beijados pela fortuna, fugiam
ao maior ideal que a mocidade pode sonhar, depois do amor, eu, adiando no
coração a pujança do meu primeiro afeto, estudava com um fervor que só as
dificuldades podem operar, cercadas das competições daqueles que julgaria mais
felizes do que eu, se não considerasse, antes, a felicidade como uma simples
questão de ponto de vista.
Os confortos que tive nas asperezas
relativas dos estudos ruiu me fugiam jamais do pensamento saudoso. Com o
material dessas doces lembranças edifiquei o meu castelo, como o templo de
Salomão. Muitos, muitíssimos nomes entram nesta lista querida. É longo o
número, graças a Deus. E é dentre esses tantos que hoje destaco o desse amigo
tão nobre que é o Padre Mello.
Considero a influência por ele
exercida na minha formação (compleição ética), a assistência constante,
ocasional ou voluntária, nas voltas da minha vida.
Foram suas mãos que me estenderam a primeira
benção da Igreja, nas primícias batismais. Depois, prosseguindo eu nos estudos,
tivemos os melhores contatos de inteligência. Já eu fazia versos (este meu
defeito é antigo!), e o bom Padre, desprezando as inúmeras imperfeições daquela
poesia adolescente, elogiava meus versos, criando-lhes imaginariamente relevos
de beleza. E, ao que me diziam muitas vezes, em palestras, ele me apontava como
esperança da terra.
E quando o estudante regressava,
depois de formado, ao seio natal, o discurso que, principalmente, o comoveu,
foi o pronunciado pelo ilustre sacerdote. Em 1915 completava eu 15 anos. O
jornal "Itabapoana" dirigido por Menezes Wanderley, publicava longa
notícia referta de elogios e ótimos votos, em seguida ao meu retrato. Recebi
então do Padre Mello a seguinte carta, que ainda conservo iluminando o meu
arquivo:
"Não podendo achar-me amanhã
nesta localidade, antecipo os meus cumprimentos de felicidade pelo seu
aniversário natalício, associando-me assim às manifestações de apreço que
certamente receberá de muitos que lhe conhecem a precocidade no desenvolver das
poderosas faculdades intelectuais que possui, por esta força, faço minhas as
merecidas referências que traz o último número do "Itabapoana".
Na dupla qualidade de sacerdote que lhe
conferi há quase quinze anos a graça do batismo pela qual entrou no grêmio da
nossa cristandade, e na de mais ou menos lidador no campo das letras, em que
ainda por assim dizer na infância deu ingresso o jovem aniversariante, não
tenho sido indiferente ao progresso rapidamente efetuado em seus estudos, antes
me alegrei sempre, como ora testemunho, com os largos passos que levam o jovem
poeta à glória, e me julgarei feliz se Deus me der ainda muitos anos de vida
para com os meus olhos contemplar o seu belo porvir, trilhando sempre o caminho
da verdade, da honra e do bem.
São estes os votos que formulo
rapidamente ao partir para uma excursão de meu ministério paroquial. Do seu
amigo e admirador Padre Antônio Francisco de Mello. Aos 6 de dezembro de
1915".
Bom Padre! Como foram consoladoras
aquelas palavras serenas de animação e de confiança! E aqueles tempos, como
traziam esperanças, tantas e tão boas que ainda não me abandonaram no ideal
humilde de vencer na vida honestamente.
Bons votos aqueles de 1915! Se foram
realizados... Serei eu quem possa afirmar?
Poeta, de algumas vezes penetrei na
Glória, voltei rapidamente como ao entrar: de bonde ou a pé, para o alvoroço da
avenida... Homem, afirmo que o meu caminho tem sido o da "verdade, da
honra e do bem.
Mas tem direito à palavra
aqueles que são meus amigos; todos quantos tiveram comigo alguma divergência e,
principalmente, os que necessitam dos meus serviços, procurando-me como homem
de negócio.
Fevereiro de 1925
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