Maryse Carneiro |
Como não gostar de Bom Jesus? Do Itabapoana tirávamos aquele peixe bonito - o piau - para enfeitar o nosso almoço. Do mesmo rio, às vezes, a água para o "banho de balde"... Sim... Simples assim. Porque era muito simples a pessoa que preparava o almoço, no "fogão de fita"... No corpo franzino, minha sogra carregava amargura imensurável, pois...
No dia 24/12/1947, véspera de Natal, portanto, o pequeno Nelson saía de casa em direção ao armazém do pai, a poucos metros dali. Não sabia que sua vida estava por um fio... de alta tensão. Despencando de um poste, como um raio atingiu a criança. Num tempo em que a cidade nem contava com rede elétrica comum...
Seis
anos depois, quando me casei e fui morar lá, a tragédia era ainda assunto de
conversa... E, como era de se esperar, naquela família nunca mais ocorreriam
festejos, muito menos comemorações de Natal. Acho que meus filhos se
ressentiram disso...
Apaixonada
como estava, não cogitava ou questionava o amor. Se quisesse, iria ao cinema e
veria aquilo que Hollywood exibia nas telas. Em soirée ou matinê...
De
amor mesmo, só tomei conhecimento quando me deparei com meus sogros arrulhando
no sofá da sala, ela no colo dele... Penso hoje ter sido esse amor o esteio do
meu casamento... Outra coisa que fui conhecer em Bom Jesus: o calor... O humano
também...
Grandes
amigas, grandes amigos, o maior deles, meu sogro! Quando fomos pra Niterói –
era de praxe, para os filhos estudarem - correspondíamos através de cartas...
De política, do certo ou do errado, surgia o assunto... “Crise – a maior é a de
caráter” - dizia ele, quando as coisas desandavam...
Com
aquele calor – e a falta de geladeira - aprendi que feijão e leite deveriam ser
fervidos de manhã e à noite. Carne, só de porco, enfurnada em latas de gordura.
Frutas, apenas banana caturra, como chamavam a nanica... Verduras, plantadas na
horta, regadas e colhidas por meu sogro. Mas o cultivo preferido dele – e só
ele sabia a hora de colher – era a pinha... Docinha, uma delícia, no ponto...
E
os termos?! Dois deles me encucaram – “pagarela” e “puaia”... Sem jeito
perguntei à sogra o que queriam dizer... “Quando a pessoa exagera nas atitudes,
o outro diz que aquilo é pra aparecer, pra galera... O outro termo, puaia- “quando alguém conta, feliz, ter sido elogiado, o outro (malvado!) corta aquele
barato”, dizendo: “Comeu puaia, hei?!”...
Mas eu creio
que maldade, em Bom Jesus, só essas duas, mesmo... Pelo menos, eu não
presenciei outras...
bom Jesus já foi muito melhor, hoje está abandonada pelo poder público.
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