Octacílio de Aquino
De Minas muito sei, afora o que me palpita o coração, por um soberbo
livro de Manoel Bernárdez, ex-ministro uruguaio no Brasil e grande amigo da
nossa terra e da nossa gente. Não sei, porém, se os quadros sinópticos e as
estatísticas oficiais poderiam, com as suas demasias de algarismos e
superfluidades numéricas, exercer no meu espírito as maravilhas que exerceu a
admirável obra. Conto que não. Porque ali, onde os cômputos se exalçam de uma
eloquência inédita, e o pleno conhecimento de causa estadeia uma confiança
ilimitada nas perspectivas do Minas, há, também, esse entusiasmo forte da vida,
que transcende no ideal, e sobe do tumulto vário da terra até aonde o sonho não
é defeso. Não há uma confusão de cifras, como não há um rebentar de paixões. Ha
uma fartura de sub-solo inexaurido, por mais que minerado; há uma opulência de
terras, que não desvanece nunca; há uma excelência de clima orçando, nessa
altitude de oitocentos metros médios, por um jacto perene de saúde, ou um gesto
assíduo de Deus. E há, sobretudo, o homem, a nobre gente mineira, tão simples
na sua brancura d'alma quão profunda nos lances do caráter, da melhor têmpera,
da com que se fazem os santos e os verdadeiros soldados. Contemplo, na
iluminura do espírito, a passagem daquelas riquezas de em torno, e desses
assombros morais. É um desfile harmonioso, Onde se afirma, indesmentível, o
intercâmbio da terra com o céu — a boa-vontade do semeador e os favores do
infinito, livores e eflúvios que não se tocam de fantasia, mas que sangram de
verdade: no faiscar dos garimpos, nas oferendas das bacias, na variedade dos
campos, no garbo de raça e de saúde que a pecuária ostenta, perpetuamente
ilesa, afrontando as intempéries. É um cortejo de altíssimas qualidades d'alma,
precipitadas na História (Evaristo da Veiga, Bernardo Pereira de Vasconcellos,
Araujo Vianna, Honorio Hermeto, Limpo de Abreu, Ouro-Preto, Lafayette, entre
tantos), borbulhando no auge dos negócios, o espírito completo na inteireza de
austeridade e de fé, iniciado nas belíssimas tradições familiares, e
continuado, depois, na frequentação dessa dignidade permanente que a própria
terra mineira exprime; num crescendo de intenções ... Salve! Numa época de
tantos malogros e vicissitudes, de tristezas todos os dias, de misérias todos
os dias, época de iniquidades e traições em que, todos os dias, Abel sucumbe
aos golpes de Caim — não podias passar, Minas eterna, incólume! O espírito
liberal, porém, que já se disse viver nas tuas montanhas, nas tuas florestas e
nos teus gerais "como a alma eterna de um povo difusa pela natureza
extensa", resistirá! Não se contagiará da fúria dissociativa esse conjunto
formidável de invencível força e de influência decisiva na sorte nacional!
Grande terra! Povo imenso!
Novembro-1929
Eloquente! Muito bonito o texto!
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