domingo, 7 de setembro de 2025

A aldeia global, o eco dos imbecis e os mercadores do silêncio

 

Umberto Eco: "as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis"

Foi em Turim, no ano de 2015, que Umberto Eco, mestre da palavra e da lucidez, ergueu sua voz contra um fenômeno que já se fazia ensurdecedor: “as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis.”

Afirmou ele na época: "As redes sociais deram o direito à palavra a legiões de imbecis que, antes, só falavam nos bares, após um copo de vinho e não causavam nenhum mal para a coletividade. Nós os fazíamos calar imediatamente, enquanto hoje eles têm o mesmo direito de palavra do que um prêmio Nobel. É a invasão dos imbecis".

Não era apenas um insulto, era um alerta.

Antes da internet, o idiota da aldeia limitava-se ao balcão de um bar, murmurando bravatas dissolvidas na espuma de uma cerveja. Ruído breve, inofensivo, sem eco.

Mas o mundo mudou.

Com a rede, o mesmo idiota ganhou púlpito, plateia e holofotes. Do balcão à aldeia global, foi promovido a pregador da verdade absoluta. E ali, onde antes se ouvia o silêncio dos sábios, a gritaria dos ignorantes passou a disputar espaço com a voz de um Nobel.

Eco não condenava a democratização da fala, seria inútil e injusto. O que denunciava era o descuido com a cultura, a renúncia ao pensamento profundo, a preguiça de verificar, refletir, estudar.

Os jornais, dizia ele, deveriam ser filtros, muralhas contra a enxurrada de falsidades que a web multiplica. Mas até eles, muitas vezes, sucumbem à pressa, ao espetáculo, ao drama que alimenta curtidas.

E assim seguimos, entre vozes sábias abafadas e gritos vazios amplificados.

A aldeia global tornou-se palco onde cada qual acredita ser protagonista, ainda que não conheça o enredo, ainda que nunca tenha lido o roteiro.

Umberto Eco, com ironia amarga, nos lembrava: não basta falar, é preciso saber o peso da palavra. Não basta ter voz, é preciso ter cultura, reflexão e, sobretudo, compromisso com a verdade.

Porque o maior risco não é que os idiotas falem.

O maior risco é que, em meio ao barulho, deixemos de ouvir os que realmente têm algo a dizer.

Mas a história não parou aí.

Daquele ano até hoje, a advertência de Eco encontrou um novo agravante. Como afirmou o cofundador do Telegram, Pavel Durov, em agosto de 2025, já não se trata apenas da invasão dos imbecis: agora, a criminalidade fincou raízes na praça digital.

Durov alertou usuários da plataforma, que bloqueará canais envolvidos em extorsão. "Um banimento por esse motivo significa que temos evidências inegáveis de que os administradores de um canal publicaram postagens difamatórias e as excluíram em troca de pagamento das vítimas."

Além disso, salientou que alguns canais foram até flagrados vendendo os chamados "blocos de proteção", taxas que as vítimas devem pagar para não serem alvos. Durov alertou os golpistas para não perderem tempo criando canais clones, pois eles também serão bloqueados mais cedo ou mais tarde.

Canais de chantagem florescem na sombra, vendendo silêncio como mercadoria. “Blocos de proteção” são cobrados de vítimas para que não sejam alvo de difamação. Postagens difamatórias surgem, depois desaparecem, não pela busca da verdade, mas pelo preço pago para calar a mentira.

Durov, ao prometer bloqueios, foi direto: “O Telegram não é lugar para chantagem.” Mas sua fala escancara a gravidade do cenário: a aldeia global não é mais apenas barulhenta; tornou-se também perigosa.

Se Eco temia a invasão dos imbecis, Durov agora nos alerta para algo ainda mais sombrio: a colonização da aldeia global por mercadores de silêncio. O que antes era barulho vazio tornou-se moeda de chantagem. E, se não estivermos atentos, a verdade não morrerá em meio ao ruído, mas será vendida ao mais alto lance.

Pavel Durov: "O Telegram não é lugar para chantagem"



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