sábado, 28 de outubro de 2023

GOTINHAS DE HISTÓRIA


                                             Onda negra, medo branco?


Isabel Menezes 


Quando cursava minha faculdade, uma das leituras foi o livro "Onda negra, medo branco", de Celia Maria Marinho De Azevedo. Essa autora descreveu com maestria a relação entre brancos e negros, no século XIX, o receio que a população branca possuía, em relação ao aumento da população de cor negra no Brasil, já que no Haiti, os negros se rebelaram, fazendo a independência do país.  

Os negros eram recrutados na África, pelos traficantes de escravos, em um negócio bastante lucrativo. Eles faziam acordos com os chefes de tribos africanas, que negociavam não só seus prisioneiros de guerras tribais como também seus subalternos, por qualquer motivo torpe que fosse. Assim, eram embarcados para o Brasil, amontoados em navios negreiros ou tumbeiros, onde viajavam em precárias condições. Não eram poucos os que morriam na viagem, ou adquiriam doenças.  

No poema navio "Negreiro", Castro Alves entoa para nossa triste lembrança: “Era um sonho dantesco... O tombadilho/ Que das luzernas avermelha o brilho,/ Em sangue a se banhar. /Tinir de ferros... estalar de açoite.../ Legiões de homens negros como a noite,/ Horrendos a dançar... / Negras mulheres, suspendendo às tetas! /Magras crianças, cujas bocas pretas,/ rega o sangue das mães: /Outras moças, mas nuas e espantadas, /no turbilhão de espectros arrastadas,/ em ânsia e mágoa vãs!”

E assim transportados, os que conseguiam chegar eram encaminhados às praças de negócios, onde permaneciam acorrentados até que um fazendeiro os arrematassem como se fosse um animal. Muitos senhores eram tementes a Deus e tratavam bem seus escravos, com a dignidade condizente à época, pois a escravidão já vinha da grande África e era permitida legalmente no mundo. Como professora de História, aprendi a não julgar os acontecimentos históricos com os conhecimentos atuais, já que não vivi em tal época, mas todo tipo de escravidão é algo inaceitável, com a mentalidade que temos hoje em dia.  

O livro "Onda negra, medo branco", é ainda hoje muito atual e merece ser lido, pelos amantes da literatura. Claro, com uma leitura crítica. “O que fazer com o negro quando a escravidão terminar? Ou então, como impedir um final brusco da escravidão, deixando à solta e sem nenhuma regra uma imensa população de negros e mestiços pobres em país regido por uma minoria de ricos proprietários brancos?" Em "Onda negra, medo branco", encontraremos um intenso debate em torno destas questões senhoriais travado por abolicionistas e imigrantistas ao longo do século dezenove. Decerto esse debate ainda se arrastaria pelo tempo não fosse a intervenção dos próprios escravos com suas ações autônomas e violentas, aguçando os medos da ´onda negra´, imagem vívida forjada no calor da luta por elites racistas.

Todo tipo de escravidão é um ultraje, uma desumanidade, pois não existem raças e sim a RAÇA HUMANA, na qual todos somos iguais diante de Deus. A consciência de cada um deve ser bem instruída quanto a dignidade de filhos de Deus, herdeiros do céu, dignidade esta, que cada ser humano se encontra revestido.

(Isabel Menezes - Professora de História e Ensino Religioso, estudiosa social e escritora de Varre-Sai/RJ)

Um comentário:

  1. O retrato do nosso país, desumano, desigual e injusto... A luta é diária!✊

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