Lições de Vida
Maria Geralda e Ana Maria |
Aconteceu no distrito de Rosal, entre os dias 17 e 20 de novembro, a décima edição da comemoração pelo Dia da Consciência Negra.
Ana Maria de Sousa foi a idealizadora do evento, em 2002. Conta ela que no dia 20 de novembro daquele ano, recebeu um cumprimento por parte de Sandra Nunes: "Eu, então, indaguei. 'Parabéns por que?'. E Sandra respondeu: 'Hoje é dia da Consciência Negra'. Como eu desconhecia o fato, e não dava tempo para organizar nada, passei a articular uma comemoração para o ano seguinte".
Segundo Ana, " em 2003 realizei um almoço em minha casa, organizei uma festinha de comemoração, com palestra e desfile da beleza negra". Hoje, 10 anos depois, as comemorações que envolvem o Dia da Consciência Negra tomaram proporção de festa oficial do município, mobilizando toda a comunidade, o que é festejado por todos os organizadores.
"Em 2003, quando foi realizada a missa pelo dia da Consciência Negra, por um padre negro, recordo-me que havia algumas pessoas que entraram na capela. Outro grupo de pessoas, contudo, ficou nas escadarias e um terceiro grupo preferiu ficar na calçada, meios desconfiados. Hoje somos todos unidos por um só ideal", esclarece Ana.
O SONHO DE ANA
O sonho de Ana Maria é que "a deputada federal Benedita da Silva, que instituiu no Estado do Rio de Janeiro o feriado do dia 20 de Novembro, quando foi governadora, possa vir aqui. Nós iríamos recebê-la com muito carinho. Eu queria aproveitar e lembrar, também, das pessoas que hoje não estão aqui, mas nos apoiaram muito, como Juceli, Vitalino, os pais da Zeze, dona Letícia, mãe da Letícia Freitas, entre outras. No início não tínhamos nada. Hoje, cada pessoa que vem aqui prestigiar o nosso movimento é uma força a mais para nós", assinala Ana.
DE CARATINGUETÁ PARA ROSAL
DE CARATINGUETÁ PARA ROSAL
A matriarca Azenir Maria de Sousa |
Ana Maria é filha de Azenir Maria de Sousa, nascida no dia 1o./07/1922. A matriarca da família esbanja vitalidade e lembra que nasceu na localidade de Ponte Branca, do lado do Espírito Santo: "Nasci na Fazenda do Jasper, de propriedade de Joaquim Pereira de Rezende, mas fui criada em Água Limpa, zona rual de Rosal, para onde meu pai se mudou, logo que eu nasci.
Prossegue ela "Meus pais, José Miranda e Agripina Maria Clementina, vieram da cidade de Guaratinguetá (SP), com o fim da escravatura. Os fazendeiros de lá venderam suas propriedades e compraram áreas em Água Limpa. Trouxeram, então, meus avós, que eram negros de fazenda, ao contrário dos negros da senzala, que permaneceram por lá. Meu pai tinha 5 anos e minha mãe era recém-nascida, quando vieram para Água Limpa.
Ferreirinha era um desses fazendeiros que necessitavam dos negros de fazenda para cuidarem da Sinhá e amamentarem os filhos da Sinhá.
Ferreirinha era um desses fazendeiros que necessitavam dos negros de fazenda para cuidarem da Sinhá e amamentarem os filhos da Sinhá.
Dos descendentes dos fazendeiros que vieram para cá, e aqui se encotram, atualmente, há o Nilo Ourique. Gostaria de ressaltar que, na época, os pobres não estudavam, mas meu pai estudou e se destacou por isso. Pelo lado paterno, tive 7 tios: José, Benedito, Olímpio, Cecília, Jovilina, Candinha e Jóvi. Todos vieram para o Morro do Letreiro, localizado na Água Limpa, e Santana (hoje Rosal).
Pelo lado materno, tive as seguintes tias: Mariana, Vergília, Andressa, Cirilo e Leocádio, conhecido como Cadico." complementa Azenir.
Azenir casou-se com Gumercindo de Souza em 1949, em Guaçuí (ES), tendo quatro filhos: Ana Maria, João Batista, Maria da Penha e Romildo. Possui, ainda, uma filha de criação: Maria de Fátim, cinco netos e um bisneto.
André Luis, Maria José, Azenir, Ana Maria, Maria Geralda e José Antonio
Maria Geralda, por outro lado, é neta de João Norato, um dos negros que ajudaram a construir o distrito de Rosal. Ela é casada com José Antonio, e formam um casal sintonizado com a organização da festa, juntamente com outro casal: Maria José e Miguel Freitas, além do líder André Luis, Toinzinho e outros.
Segundo Maria José, "sem Ana Maria, elas não realizam nada. É ela quem puxa tudo, é a cabeça". André Luis, que nasceu na região do Quinca Reis, próximo daqui, e atualmente reside em Bom Jesus do Itabapoana, "é outro que corre atrás em Bom Jesus para ajudar em muita coisa".
Maria Geralda aproveitou para "agradecer a Deus, à comunidade e à imprena, pelo apoio".
Maria José Freitas da Silva, por sua vez, assinala que " o Dia da Consciência Negra passou a ser o momento de encontro das famílias e amigos que residem longe daqui".
André Luiz fez questão de registrar sua "alegria e satisfação em estar junto com seus companheiros para ajudar na construção de uma sociedade diferente".
Comida preparada na casa de Azenir e Ana Maria é distribuída para a comunidade
Na cozinha da casa de Azenir e Ana Maria foi preparado o almoço comunitário, que foi distribuído gratuitamente para todos que se fizeram presentes na grande comemoração do dia 20 de novembro.
DE ITABORAÍ PARA ROSAL
Itaboraí (RJ) consta como participante oficial das festividades, graças a Custódio Hosquem Barreto.
Ele nasceu em Água Limpa e, com 8 anos, mudou-se para o município fluminense com seus pais.Conta ele que devido a um contato que teve com uma prima, participou das festividades do ano passado, juntamente com outros parentes. "A alegria foi tão grande em rever os familiares que viemos este ano em 46 pessoas, locando um ônibus. Havia gente para lotar 3 ônibus, mas como não havia infraestrutura para todos, preferimos vir em um só ônibus, já que estamos alojados nas dependências da Escola Estadual Luiz Tito de Almeida".
Custódio Hosquem Barreto: retorno às origens
Custódio registrou, ainda, que resolveu " comprar um terreno no bairro Cantinho do Céu e pretendo, no ano que vem, trazer três ônibus lotados, e, se possível, alojar os parentes na construção que pretendo realizar".
NEGROS QUE FIZERAM A HISTÓRIA EM ROSAL
Durante o evento, ocorreu uma significativa exposição intitulada "Negros que ajudaram a construir a Vila de Rosal", na Escola Estadual Luiz Tito de Almeida., onde constou a referência às seguintes famílias:
DOMINGOS, ALVES, BARBOSA, SILVA, CESAR, SILVA, ZEFERINO, CALDAS, LUCAS, DIAS, SOUSA, VIANA, FERREIRA, BARRETO, MAXIMO, MIRANDA e SOUZA.
Fotos e objetos do tempo da escravidão integraram a Exposição, ao som de músicas sobre Rosal, interpretadas pela compositora Sandra Nunes.
Fotos e objetos do tempo da escravidão integraram a Exposição, ao som de músicas sobre Rosal, interpretadas pela compositora Sandra Nunes.
André Luis, da Rádio Bom Jesus, entrevistou Nenzinho da Barra |
Brechó da Escola Estadual Luiz tito de Almeida virou tradição |
Os negros de Rosal dão uma
demonstração ao Brasil e ao mundo que a construção de uma sociedade
igualitária é possível, inspirando-se na luta de seus antepassados, cujo
exemplo de vida permanece vivo nos dias de hoje.
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