terça-feira, 1 de agosto de 2023

O assassinato de Alcinda Pinheiro Lopes Pinto e a Justiça Divina

   Por Gino Martins Borges Bastos
Alcinda Pinheiro Lopes Pereira Pinto


 
Em 1937, o ambiente social e político no Brasil estava efervescente.

O presidente era  Getúlio Vargas e as eleições presidenciais estavam marcadas para o dia 3 de janeiro de 1938. Um dos fortes candidatos era Plínio Salgado, líder da AIB (Ação Integralista Brasileira), cujo lema era "Deus, Pátria e Família".

Em Campos dos Goytacazes, foi marcado um comício dos integralistas para o dia 15 de agosto, na praça São Salvador. A tensão  era grande. Plínio Salgado comunicou que não se faria presente, pois tinha sido ameaçado de morte se comparecesse ao evento dos camisas-verdes.

Por conta disso, houve um deslocamento de tropa militar para garantir a segurança do comício, sob a liderança do Tenente Coracy Ferreira de Souza, o comandante das Forças Armadas, com poderes militar e civil.

Tenente Coracy Ferreira de Souza foi nomeado Delegado Militar, em 1936, para as regiões de Campos dos Goytacazes, São João da Barra e Itaperuna, região a qual Bom Jesus pertencia (foto do jornal A Voz do Povo)



Em relação ao Tenente Coracy, deve-se dizer que ele era um delegado especial rigoroso, e havia sido nomeado para as regiões de Campos dos Goytacazes, São João da Barra e Itaperuna, região a qual Bom Jesus pertencia.

Coracy era conhecido como militar implacável contra os pistoleiros e ladrões de gado que agiam em nossa região. A tortura era usada regularmente como método para obter confissão e criminosos costumavam sair da cadeia para o cemitério. Acumulou poder que intimidava até os coronéis políticos.

O fato é que o Tenente Coracy dispôs sua tropa composta de 25 homens, para garantir a segurança do comício, que contava com cerca de mais de cinco mil pessoas, entre adeptos do Sigma, como eram chamados os partidários de Plínio Salgado, e curiosos que se fizeram presentes, colocando 13 militares na parte de trás e 12 na lateral direita. 


Jorge Pereira Pinto 


Entre os presentes, estavam Jorge Pereira Pinto, então vereador de Campos dos Goytacazes, e sua esposa Alcinda Pinheiro Lopes Pereira Pinto.

Em certo momento, militares dispararam contra a multidão, matando dez pessoas, incluindo Alcinda, que foi atingida na cabeça, por trás, e ferindo dezenas de outras pessoas.

Para caracterizar um homicídio, basta que o criminoso assuma o risco de produzir o resultado morte, como aconteceu no fatídico dia.

Em decorrência da morte de Alcinda, quatro filhos ficaram órfãos: Carlos Alberto, 11 anos, Jorge Renato, 10 anos, Antônio Carlos, 9 anos, e Maria Lucia, 5 anos.


Antônio Carlos Pereira Pinto, filho de Alcinda Pinheiro Lopes Pereira Pinto e Jorge Pereira Pinto


Jorge se casou de novo, depois, com Albertina, irmã de Alcinda, que já tinha um filho, Carlos Magalhães. Jorge não teve filhos do segundo matrimônio.

Várias versões foram divulgadas pela imprensa, de acordo com a tendência política dos veículos de comunicação. O jornalista Silvio Fontoura, proprietário do jornal "A Noite", de Campos, exerceu o jornalismo de maneira profissional e isenta, recolhendo, inclusive, os nomes das pessoas assassinadas.

Silvio Fontoura, aliás, foi quem lançou o primeiro jornal de Bom Jesus, o "Itabapoana', em 1º./08/1906, atendendo convite do conterrâneo campista Pedro Gonçalves da Silva Jr (Coronel Pedroca), que, por sua vez, exerceu a função de presidente do 1º. Conselho de Intendência - equivalente a prefeito - de Bom Jesus, entre 25/12/1890 e 24/03/1891.

Oitenta e sete dias depois dessa mortandade, no dia 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas deu um autogolpe e instituiu o Estado Novo, que se prolongou até 1945.

Na primeira sessão da Câmara Municipal, após o morticínio, Jorge Pereira Pinto pediu "Punição para os desumanos!".

E concluiu seu pronunciamento pugnando pela Justiça Divina:

"No cemitério da cidade, dez sepulturas foram abertas. Dentro delas, dez corpos desceram para a eternidade, e sobre elas, dez cruzes se erguem com os braços atirados para os céus, como a pedir, numa súplica extrema, num apelo lucinante, a Justiça de Deus, porque a justiça dos homens vai se tornando tarda e improfícua".


Bibliografia

"SÓ O AMOR VENCE, uma história tão real quanto a vida", José Renato Pereira Pinto, Nova Era, 1999;

"Campista, nem fiado nem à vista, a saga dessa gente que não se vende", Yvan Senra Pessanha, Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro, 1999;

"ROBERTO, A PEDRA E O FOGO", de José Sérgio Rocha, Editora Casa Jorge, 2003;

"De Município a Distrito, Primeira Emancipação de Bom Jesus do Itabapoana", Coleção Histórias de Bom Jesus, Luciano Augusto Bastos, Editora O Norte Fluminense, 2006;

Jornal "Itabapoana", de 1o. de agosto de 1906, editado por Silvio Fontoura, acervo do Espaço Cultural Luciano Bastos, Bom Jesus do Itabapoana;

Entrevista com Antônio Carlos Pereira Pinto ao jornal "O Norte Fluminense", de Bom Jesus do Itabapoana, 2023.


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