terça-feira, 18 de julho de 2023

"UM PERSONAGEM DE ITAPERUNA: HUMBERTO LINDELAUF", por Laércio Andrade de Souza

 


Dizem que os grandes homens não morrem. Ao contrário, transformam-se em mitos. Sobrevivem, não raro, em forma de lendas, as mais imaginosas que acalentam nossa saudade, frutificam em nosso espírito e servem, muitas vezes, para explicar o inexplicável, o misterioso, o irreal.


Comenta-se, numa dessas lendas em terras argentinas, que Carlos Gardel não morreu; mas sofreu um horrível desastre automobilístico, que marcou seu rosto de maneira tão disforme, que o cantor nunca mais teve coragem de apresentar-se em público. E, hoje, anonimamente, canta sobe proteção de uma máscara facial e luz negra, nas boates e cafés empocinado dos arredores de Buenos Aires, a La Camparsila e outros sucessos, que encantavam multidões na década de 50.

O mesmo se fala de John Kennedy que, paralítico pelos ferimentos de Dallas, "vive" enclausurado numa Ilha de Caribe, alheio ao mundo em seu redor, longe dos problemas que tanto o preocuparam nos anos 60.

Verdade ou mentira, lenda ou não, os fatos que acontecem com personagens celebres quase sempre entram para o campo, que vai de mitologia ao pouco provável, mas tem o sabor de dar uma conotação diferente à realidade.

Assim foi, também, com Humberto Lindelauf, o mais brasileiro de todos os alemães. Aportou em Itaperuna muito jovem, criou um estilo progressista numa época em que subsistia a ideia de que o pároco devia manter-se afastado do povo, pois só assim preservaria sua santidade. Era preciso uma quase clausura para despertar no povo a imagem da mística e da respeitabilidade.

Lindelauf não arregaçou as mangas, passou a construir igrejas, a remodelar pensamentos, a planificar obras sociais. Com o carisma dos lideres e a credibilidade do sacerdócio, foi edificando obras e corações numa autêntica harmonia entre as coisas do céu e as necessidades da terra, que tanta discussão ainda hoje assola os teólogos, esquecidos que, na simplicidade das fórmulas, encontra-se solução dos mais intricados problemas. É o "Pêndulo" de que já proclamou a versão cinematográfica da vida.

É no equilíbrio, não estático, que se encontra a harmonia do universo.

Egocêntrico, como fora Jesus em sua pregação, construiu belezas, sem deixar rivais.



Penetrou tão fundo na alma itaperunense que, praticamente, nada se fazia de grande na cidade sem consultá-lo.

Várias vezes eu flagrei o religioso debruçado em livros de cálculos, planejando o local da estátua do Cristo Redentor, para fixá-la num local íngreme, que pudesse ser visto por todos os ângulos da cidade.

A matemática era sua paixão, o que não impedia de dedilhar o piano ou escrever estórias para crianças e tomar chope na inauguração de um bar.

A versatilidade do homem, a austeridade de professor, a invocação do eclesiástico em seu ministério, tudo parecia se encaixar harmonicamente no homem, às vezes rude como um leão e dócil como um carneiro.


Tinha uma singularidade de passar da cólera à mansidão, numa rapidez extraordinária, o que mansamente assustava e enobrecia os que o cercavam.

Todavia, os anos não passam à toa. Veio o progresso, os problemas se avolumaram, a exigência dos tempos modernos para com o homem e a solicitude da população queriam de seu líder mais e mais, sem descontar a parcela do limite humano de todos, mesmo os mais dotados. E Lindelauf, não resistindo, foi "procurar sua floresta" como na lenda bávara, onde consigna-se que "os pássaros nascidos no bosque germânico, quando pressentem a morte, para lá voam a fim de repousarem tranquilos nos arredores dos ninhos que nasceram".

Lenda, mito, fértil imaginação, mas assim foi com Humberto Lindelauf.

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