Pobres
ricos
Luciano Rezende
A
geração dos que nasceram após a década de 1990 certamente não vai se lembrar,
mas todos os que nascemos antes disso trazemos na memória a fuga de brasileiros
rumo aos Estados Unidos em busca de trabalho.
Muitos
desses brasileiros saíam ilegalmente rumo aos EUA, sem eira nem beira, para
trabalhar no que fosse possível. Obviamente, como eram clandestinos, aceitavam
as piores tarefas e as mais baixas remunerações, totalmente excluídos de
qualquer tipo de direito trabalhista ou da formalidade.
Como
mineiro que sou, e pertencente a uma geração que nasceu na década de 1970, me
lembro perfeitamente da menção depreciativa que se faziam da linda cidade de
Governador Valadares. O município que abriga o Pico do Ibituruna era conhecido
como Governador “Valadólares” em alusão à quantidade de cidadãos que, sem opção
de emprego no Brasil, eram impelidos a buscarem dólares americanos para enviar
às suas famílias que ficavam por aqui. Em 2002 (último ano do Governo FHC), a
cidade tinha 250 mil habitantes, sendo que mais de 40 mil viviam nos Estados
Unidos.
Isso
acontecia por todo o país e era amplamente divulgado pela imprensa. Brasileiros
sem perspectivas de vida abandonavam seu país, suas famílias e amigos, em busca
de dias melhores. Não lhes restavam alternativas.
Hoje
isso mudou. Milhões de brasileiros, desde a primeira eleição de Lula, voltaram
ao nosso país justamente por aquilo que internamente nossa mídia oculta dia e
noite: o aumento sucessivo da renda e a diminuição do desemprego.
Segundo
relatório da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da
República, baseado em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio
(Pnad) do IBGE, entre 2001 e 2011 a renda per capita das famílias brasileiras
cresceu 32,6% (2,9% ao ano), passando de R$ 591 para R$ 783,00. A pesquisa
mostra ainda que, entre a classe média, o ritmo de crescimento da renda foi
acima da média. Nos últimos dez anos, o rendimento per capita desse grupo
passou de R$ 382 para R$ 576, variação de 50%, ou 4,2% ao ano. O estudo destaca
que o número de postos de trabalho cresceu 20% no período com ampliação de 16
milhões de vagas, passando de 76 milhões em 2001 para 92 milhões em 2011, o que
consequentemente levou a uma queda na taxa de desemprego.
Esses
são alguns números, comprovados por vários outros estudos de diversas
instituições e universidades, que nos ajudam a entender como o Brasil conseguiu
reverter o êxodo de sua população em busca de dias melhores em outros países.
Mas
por incrível que pareça, por uma dessas ironias da vida, há aqueles que estão
deixando o nosso país por outro motivo, diferente da falta de perspectiva de
emprego ou da diminuição da renda: a insatisfação com esse novo Brasil que vai
surgindo.
De
acordo com a reportagem do The Wall Street Journal Americas de 09/02, "já
faz décadas que os ricos e poderosos do Brasil vêm adquirindo imóveis de luxo
em Miami e comprando vorazmente nas lojas de Bal Harbour. Nos últimos meses,
porém, um bom número de brasileiros reagiu à reeleição de Dilma Rousseff decidindo
fincar raízes mais duradouras na região de Miami".
Pobres
ricos brasileiros!!! Não estão mais suportando esse flagelo de ver a ralé
ascendendo social e economicamente no seu torrão natal. Negam-se a conviver com
a gentalha e fogem para Miami. Claro que o pretexto é outro, tal como quer
fazer crer certo brasileiro já “exilado” naquela região e porta-voz dos
“brasileiros honestos”.
Ainda
segundo a reportagem, “um exemplo típico desses exilados de classe alta é a
dona de casa Regina Sposito Pires, que mora em São Paulo e recentemente fez uma
viagem de exploração com sua família para comprar um imóvel em Miami. Depois de
pensar no assunto por algum tempo, Pires, que tem 45 anos, tomou uma decisão em
26 de outubro, quando Dilma conquistou seu segundo mandato numa eleição
apertada. ‘Foi como se alguém tivesse morrido’, diz Pires, mencionando sua
frustração com a alta taxa de criminalidade do Brasil e a corrupção no governo.
‘Eu disse ao meu marido que a pouca vontade que eu tinha de ficar no Brasil
tinha acabado’”.
Essa
elite vai para Miami morar em condomínios de luxo, leva suas riquezas obtidas à
custa da mais-valia sobre trabalhadores brasileiros e ainda posa como vítima.
Pobre elite refém de um país inseguro para guardar suas fortunas em períodos de
turbulência política e econômica como o Brasil. A julgar pelas investigações
que estão sendo feitas no HSBC e outros bancos e paraísos fiscais, não estão de
todo errados. Até a ameaça de um famigerado imposto sobre grandes fortunas
esses pobrezinhos estão sofrendo aqui no Brasil. Quanta injustiça!
É
como bem disse um autêntico representante desses inconformados com o governo do
PT, o antropólogo Roberto da Mata: "A elite brasileira não gosta do Brasil
e não se pode cultivar o que não se gosta. Se existe desprezo, não existe
reflexão". Pois bem, que fiquem por lá. Brasileiro por brasileiro sou mais
o trabalhador que, como bom filho, para casa voltou desde o primeiro mandato de
Lula.
Luciano Rezende é professor do IFF/Bom Jesus
Luciano Rezende é professor do IFF/Bom Jesus
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