terça-feira, 17 de maio de 2016

MORIBUNDA e MORTA. Poesias de Padre Mello






MORIBUNDA

 Publicada no jornal Itabapoana em 08/08/1906

Quem a conhece? Quem dirá que outrora
Foi um primor de graça e de candura?
Cheia de vida, cheia de frescura,
e tão desfeita e esmorecida agora!...

Parece aquela flor que à luz da aurora
E ao sorrir da manhã serena e pura
A fronte inclina para a terra dura,
Murcha, definha, abrocha-se e descora.

Perto lhe vem os últimos momentos;
Vai desprender-se a divinal essência
Do débil organismo em ritmos lentos.

Olhos que a vistes rindo na inocência
Que lágrimas tereis, em vãos lamentos,
Para chorar tão longa e triste ausência?!...

31/07/1906




MORTA 



 Publicada no jornal  Itabapoana em 15/08/1906
 

E ausentou-se!...já corre o pranto triste
Sobre o gélido invólucro sem vida
Ei-lo como uma pétala caída
de pobre flor que solitária existe.

E tu, filha do céu, que ao céu subiste
Sempre o verás na fúnebre jazida
Como relíquia sacra ao pó volvida,
Venerada por nós, a quem fugiste.

Bela chamou-te quem te viu as graças
Boa quem viu segredos de tua alma,
e santa o esposo que no céu abraças.

Menos punge esta dor que não acalma
Menos sentimos amargo as taças
Que na terra e no céu tens linda palma.


04/08/1906

































Poesia de Padre Mello escrita em janeiro de 1902, dedicada ao português Manoel Antônio de Azevedo Mattos e sua esposaTereza de Azevedo Mattos, após o falecimento de sua filha Inhá (Maria Thereza de Azevedo Mattos)









CRIANÇAS
Quando vos vejo, crianças
cantar, pular e sorrir
nos ombros soltas as tranças,
fitas no chão a cair;

Quando vos vejo contentes
sem sombra de algum pesar,
sem saudades de ausentes,
sem os cuidados do lar;

Quando vos vejo o olhar doce
em qualquer um que mirais
como se o mundo só fosse
o que vós sois e não mais;

Então me lembra, crianças;
que já fui o que vós sois,
e que ao tombar de esperanças
sereis o que eu sou... depois!



ALGUMAS CANTIGAS SOLTAS
O sol também sede,
também nos merece dó
bebeu a água da lama
e a lama tornou-se pó.
X X X
Eu fui colher saudades
Onde saudades plantei.
Saudades trouxe comigo,
Saudades por lá deixei.
X X X
Quem teve amores ao longe
Teve saudades ao pé;
Os olhos são regadores,
Se o amor falso não é.











MORRER SONHANDO

Cedo, bem cedo, perderei a vida,
planta ferida no mimoso pé.
Teu desengano perecer me ordena,
na idade plena de esperança e fé.

Porém a morte me é suave e doce
como se fosse uma ilusão de amor;
embora eu sinta que uma luz se apaga
outra se afaga de eternal fulgor.

Morrer sonhando! Como é doce a morte!
Que vale a sorte que esta vida tem?!
A vida é sempre uma fugaz mentira,
a morte aspira a realidade além.

Morre este corpo de servil matéria.
Baixa á miséria de funéreo pó,
porem minha alma sempre viva sonha
vida risonha; não mereço dó.

Beijo-te a mão que me assassina e creio
que ela me veio libertar ao fim.
Morrer sonhando é desperta na glória,
eis a vitória. Morrerei assim.



























 






























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