domingo, 11 de maio de 2014

O ANJO QUE ANDAVA A CAVALO




                             Arnaldo Vargas Figueiredo


Nossa história contada aqui é verdadeira, seu personagem existiu, apenas o título é sugestivo, mas que nos leva a pensar como uma pessoa pode ser tão especial assim e possuidora de tantas habilidades.


O nome  do nosso “anjo” é FRANCISCO NUNES, carinhosamente chamado por todos de Sô Chiquinho, como a ele nos referiremos daqui para frente, tornando conhecida a sua história de vida. O Sr. Chiquinho era, sem sombra de dúvidas, o cidadão mais inteligente de nossa acolhedora e bela vila de Rosal.

Era filho de outro cidadão também muito especial, nobre e caridoso, piedoso e rico para os padrões de nossa época, possuidor de terras, gado, montarias e uma grande e bonita casa da nossa citada vila. O pai de Chiquinho era o CAPITÃO ANSELMO NUNES. Você talvez não saiba, naquele remoto passado, viajar para a cidade e capital federal do Rio de Janeiro não era para qualquer um, precisava-se de recursos primeiramente e também de conhecimento.


Havia quem dissesse que os abastados iam ao Rio, também contribuir com a república fazendo doações em dinheiro e “recebendo” de recompensa um título, nesse caso de Capitão, proporcional ao valor despendido. Lembro-me muito bem da ocasião em que o Capitão voltou de sua apoteótica viagem ao Rio.

 O povo foi ao casarão da vila para saber das novidades e ver as lembranças e presentes que o senhor Capitão Anselmo Nunes havia trazido. Bons tempos aqueles, tudo era novidade para nós e para todos de modo geral, havia sonhos, expectativa, desejos de se conseguir o inimaginável. Voltemos ao nosso principal personagem desta história, senhor Chiquinho. 

Ele tinha uma das suas pernas amputadas, usava uma perna de pau que ia do pé até bem em cima. Não sei bem o que aconteceu com o Chiquinho, creio que foi um acidente e não havia prótese e nem conhecimento no Brasil para solucionar o “seu problema”. Para ele não havia  o que o impedisse de fazer quase tudo, por exemplo, montar o cavalinho PIQUIRA. Era o cidadão de todos, por quê? 

Chiquinho na sua modesta oficina fazia de tudo. Ele consertava relógios de todos os tipos e marcas, de pulso, parede e carrilhão, não importava. Ele consertava todos os tipos de rádios, o aparelho mais importante das residências quando ainda não havia a geladeira, só as importadas, e mesmo assim só para pouquíssimas famílias das cidades. Não se ouvia falar da Televisão, hoje há na casa de qualquer cidadão, rico ou pobre. 

Muito bem, o Chiquinho era o faz de tudo para todos. Chiquinho consertava guarda-chuva quebrado, as sombrinhas inseparáveis das madames, colocava alças nas latas de óleo e também nas latinhas menores para servirem de utensílios de cozinha, pois não havia acontecido o “advento do plástico”, nem da Petrobrás. Enfim, tudo era possível no pensamento do Chiquinho. Pai de dois moleques espertos e também inteligentes, Antonio, o Nico, é Fluminense e o Anselmo, o Miminho, é Flamenguista, pode? Mais tarde veio a raspa do tacho, nossa queridinha Sandrinha.


O Chiquinho se virava, veja mais: representava “ O Jornal” fazendo assinantes e os distribuía nas casas em sua volta dos Correios ou os entregava em sua Oficina. Representava Companhias de Seguro. Naquele tempo a mais conhecida era a Sul-América, fazendo seguro de vida para quem podia pagar, recebia os prêmios e os remetia à capital. Chiquinho, com sua voz maravilhosa, bem postada, tomava conta dos SERVIÇOS DE ALTO FALANTE A VOZ DE ROSAL. 

Como disse antes, não havia Televisão, as informações para o povão em geral eram dadas através deste serviço, o Alto-falante. Comunicações de falecimento, convite para enterro, missas, casamentos e felicitações de aniversários com dedicação musical. Como eu gostava disso, aniversário para ir comer doces e bolos das maravilhosas doceiras que havia em Rosal. Destaque para a minha mãe de leite, Dona Lita, a prima Luzmar, dona do Bar, Tia Cota, Dona Júlia e muitas e muitas outras. 

No serviço de alto-falante se faziam dedicações anônimas de moças e rapazes apaixonados, até o momento de se descobrirem e se enamorarem. Seu Chiquinho era uma pessoa muitíssima especial, tinha o dom de fazer amizade, da paciência e da boa vontade.  Era procurado por todos, sua porta mais parecia hoje com as do INSS. Eram aconselhamentos, broncas nos pinguços e todo o tipo de informação que se queria, era com ele e também com a sua maravilhosa, risonha, divertida e habilidosa, sua esposa DONA AMÉLIA REZENDE NUNES.

 Dona Amélia pegava até cobra pelo rabo, não tinha medo, mas uma vez ela se deu mal, quase foi para COQUEIROS, como era chamado o cemitério, nos limites de seu enorme quintal. Voltando ao nosso personagem, o Chiquinho, ele também era incumbido ou se oferecia sempre para soltar os fogos nas festividades religiosas, políticas ou comemorativas. Querem mais? Pois é, o Chiquinho era árbitro de futebol, mesmo com sua perna de pau era esmerado e dedicado PROFESSOR MUNICIPAL. Lecionava na escola da Água Limpa, fazenda de seu pai, localizada na região chamada GURITA. 

Como disse, Professor Municipal, Chiquinho, infalivelmente, dia após dia, montava em seu cavalinho Piquira e ia ao encontro de seus alunos, filhos de ruralistas ou colonos, todos para ele eram só alunos. Levava a luz do saber, os bons costumes e os alienáveis princípios de amor a Deus e à nossa Pátria, o Brasil, eis porque o cognominei “O ANJO QUE ANDAVA A CAVALO”. Estava me esquecendo, o Senhor Chiquinho também foi Vereador na Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapoana, com muita  dignidade e desempenho, nos tempos em que se exercia a função sem remuneração, ao contrário, custeava a sua própria passagem, almoço etc. na sede municipal. Hoje há recompensa e jetons garantidos por altos impostos e royalties de petróleo às suas excelências, os edis.


Não poderia me esquecer: o Sr. Chiquinho também operava os equipamentos do CINE ROSAL, com maestria e seletividade cinética. No salão do cinema até pendurou uma cabeça artesanal de faroeste MONTE HALLE, meu herói, presente que lhe dei.
Aqui se encerra a simplificada história desse cidadão que nos faz mais feliz por tê-lo conhecido e com ele convivido.

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