sábado, 3 de outubro de 2015

Sr. Lao



                                         

        Saulo Soares

                

         Sabemos que a memória não é feita somente de fatos, acontecimentos. Não. Tudo isso é permeado, coberto e moído por sentimentos. Sentimentos que intensificam as recordações e que as marcam, ás vezes de forma indelével, como fazem os sacramentos na alma.

         Não conheci o Sr. Lao. O que dele sei, ouvi de seu filho, Cyro. Este foi uma das crianças acolhidas por ele.

         Creiam que conheçam a passagem bíblica que nos diz: “... todo aquele que se tornou discípulo do Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que do seu tesouro tira coisas novas e velhas.”. (Mt 13,52).  Pois bem: do tesouro de uma “velha” e enferrujada lata de Cream Crakers Aymoré, retirei, de uma missiva, o sentimento de uma profunda admiração pelo Sr. Lao.

         Numa carta endereçada a Francisco Werdan, Cyro, filho do Sr. Lao, relata: “Fui doado quando tinha vinte e dois dias de nascido e minha mãe estava quase morta com pneumonia dupla. Na roça, sem médico, tratada apenas por um farmacêutico. Esta doação não me trouxe revolta. Pelo contrário, enriqueceu-me em todos os sentidos. Passei a me orgulhar de duas famílias: os Werdan e os Monteiro de Carvalho. E, no lugar de perder, ganhei mais dois pais que, além de mim, criaram mais de dezesseis filhos dos outros, quase todos pobres ou doentes. [...] E me fez respeitar cada vez mais este casal que me adotou: Lao Monteiro de Carvalho e Maria Leite de Carvalho.” Qual não foi minha surpresa, senhores, quando li a etimologia do nome “Lao”: “Aquele que canta para adormecer as crianças.” Mais de dezesseis... pensei.

         Cyro contou-me que o Sr. Lao “aposentava” – mesmo ainda com vigor e saúde - os animais que os serviram na Chácara. Certa vez comprou um cavalo pelo quádruplo do preço (!) somente para não vê-lo apanhar mais.

         Enfim, o Sr. Lao, juntamente com o seu amigo, Esio Bastos, foram parceiros na 1ª Câmara de Vereadores de Bom Jesus e, desde a fundação (vejam só!) do nosso O Norte Fluminense. O Sr. Cyro, por sua vez, também escreveu, por anos, no importante e querido jornal.

         Amigo leitor, a partir de hoje, compartilharemos este espaço. Uma honra para mim! Memórias e sentimentos, como disse... Sou orgulhoso de uma terra que não é minha (permitam-me, por favor, tal ousadia!), mas que me deu dois grandes homens honrados. Homens do norte fluminense, homens do O Norte Fluminense.

         Meu nome é Saulo Soares Monteiro de Carvalho, filho de Cyro Werdan Monteiro de Carvalho e neto do Sr. Lao Monteiro de Carvalho.

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