terça-feira, 1 de agosto de 2017

LUZES SOBRE A FESTA DE AGOSTO, A DEVOÇÃO AO DIVINO ESPÍRITO SANTO E A CONTRIBUIÇÃO DO PE. MELLO




(Pequena contribuição para que se entenda melhor e se valorize mais a antiga Devoção e a Festa do Divino Espírito Santo, ou “”Festa da Coroa”, que originou a nossa tradicional Festa de Agosto)



Antonio Soares Borges
                            



Muito se tem dito e discorrido sobre este tema tão importante para a “alma” do povo bonjesuense, porém, não se podia imaginar, há alguns anos, que tais fatos, descritos através de muitas gerações, poderiam, atualmente, ser ordenados em datas e acontecimentos diferenciados (alguns inusitados), enriquecendo e “incrementando” a belíssima História da nossa terra. 

Ao recolhermos e juntarmos estas informações, como um divertido jogo de Quebra-Cabeças, com dados e documentos fundamentais, em especial os escritos de próprio punho do Pe. Mello e, ao lê-los, não deixam dúvidas quanto às origens e datas variadas, formando o Conjunto da nossa valiosa e tradicional Festa, transformando-a em um Mosaico de rara beleza.

Lembro que o Pe. Mello, assim que chegou a Bom Jesus, no longínquo 18/06/1899, ficou extremamente surpreso ao perceber que a principal Devoção destas terras bonjesuenses era a mesma de sua terra natal, na Ilha de São Miguel - Arquipélago de Açores (Portugal) - qual seja, a do Divino Espírito Santo, a qual, logo procurou compreendê-la, incentivá-la e enriquecê-la com alguns aspectos das Ilhas Açorianas e, como lhe era peculiar, procurou escutar e se informar sobre tudo o que dizia respeito à História e a vida, costumes e cultura de Bom Jesus e dos bonjesuenses, servindo-se para isso da boa amizade e relato, entre outros, de Francisco José Borges (o filho) e de Antonio Teixeira de Siqueira.

1º Ponto – As origens da Festa

Pelo que se pôde apurar, esta se iniciou entre os anos 1860 e 1863, e se dizia que teria começado na Barra do Pirapetinga, com procissões de fazenda a fazenda, levando os Símbolos Sagrados, Coroa e Cetro, o que temos que levar em consideração. Porém, o Pe. Mello diz, claramente, que tais atos aconteciam na então Freguesia do Senhor Bom Jesus, na Capela de Santa Rita de Cássia, e faz sentido, já que quem os trouxe, Francisco José Borges (o pai), casado com Anna Roza Teixeira, filha da matriarca da Família Teixeira de Siqueira, Dª Felicíssima, aquela que fez a recomendação da continuação à devoção e de entregá-los aos cuidados da Igreja assim que possível, chegou a Bom Jesus no ano de 1859.

Ora, a Capela de Santa Rita, desde 1852, estava em pleno funcionamento, com registros de batizados e casamentos, então, seria natural esta entrega dos Símbolos, além do que o novo Arraial apresentava um crescente movimento de pessoas e construção de moradias, com os proprietários rurais fazendo deste, local de encontro para seus negócios e, mesmo, fixando residências.

2º Ponto – A mudança da Festa para Agosto

Este é um outro ponto que causa muita confusão e que poucos sabem... Não foi o Pe. Mello o autor desta mudança, ocorrida no último 4º do Século XIX, ou seja, a partir de 1875, não sabemos o ano ao certo, porém, certamente, bem antes do Pe. Mello chegar a Bom Jesus, fato que se deu em 1899.

E ele o afirma, em escritos e documentos já publicados que, embora fizesse reparo, procurou entender os motivos, aqueles mesmos que conhecemos muito bem, não se tinha dinheiro à época, digamos, “correta”, da Festa, em Pentecostes, normalmente em Maio, o que ocorria a partir de julho. Portanto, escolheu-se Agosto, o mês do Padroeiro, o Senhor Bom Jesus, fixando-se, desde sempre, os dias 13, 14 e 15, talvez, por este último, 15, ser, à época, Dia Santo, a Assunção de Nossa Senhora, ou, Nossa Senhora da Glória, já configurando um “Tríduo”, muito comum nas Festas da Igreja e, habilmente, acolhido pelo Pe. Mello como uma inspiração do Divino Espírito Santo, pois, Nossa Senhora estava presente no Cenáculo, no Dia de Pentecostes.

3º Ponto – O Imperador da Guarda da Coroa e do Cetro

Até aqui se entendia e, assim era passado ao longo de tantos anos, que o Imperador era uma figura que surgira desde o início de nossa Festa. Porém, hoje podemos dizer com muita segurança, respaldados em pesquisa e fatos, que tal se sucede somente no ano de 1891, portanto, 8 anos antes da chegada do Pe. Mello a Bom Jesus, e o 1º Imperador, Pedro Teixeira Reis, teria, então, entre 12 e 13 anos, dependendo do mês em que teria nascido, pois faleceu aos 70 anos, em 15/05/1948.

E, não é difícil de se concluir isso, pois o pai de Pedro, aquele que fez a promessa de vesti-lo de Imperador caso este ficasse curado de uma gravíssima enfermidade, Joaquim Teixeira de Siqueira Reis, faleceu, vítima da febre amarela, alguns dias depois de ter visto o filho vestido com a roupa de Imperador, na Festa de Agosto de 1891, ano da 1ª Intendência do nosso Município, da qual fez parte, sendo homenageado pelos seus pares Intendentes em 01/09/1891 pelo seu passamento em 21/08. Portanto, 1891 é o ano em que surge o Imperador em nossa Festa.

4º Ponto – A chegada do Pe. Mello a Bom Jesus

Este é um aspecto que em muito enriquece a Festa, pois o Pe. Mello, embora respeitando a nossa Festa como a encontrou, acrescenta algumas mudanças fundamentais à mesma, todas oriundas da sua querida e tradicional cultura açoriana, tais como:

4.1- O Hino do Divino Espírito Santo dos Açores – “Alva Pomba”

Este é um legado extraordinário que o Pe. Mello nos deixou, o rico e tradicional Hino de louvor e saudação ao Espírito Santo, tão antigo que o Pe. Mello relata conhecê-lo desde muito pequeno, que caiu no gosto do povo bonjesuense desde a sua introdução, ficando como que uma marca registrada da nossa bonita Festa de Agosto.
E, pasmem, há mais de 3 anos, ao procurarmos por algo que nos falasse dele, em pesquisa feita na internet, em busca de alguma antiga partitura, nos deparamos, com o mesmo Hino, ainda hoje, bem vivo e a ser cantado nos Coros das Igrejas e tocado pelas inúmeras Bandas e Filarmônicas açorianas, nas 9 ilhas, o que expressa uma identidade comum entre os seus habitantes, sendo, inclusive, o Hino que o povo cantava nas suas 2 tentativas de luta pela sua Autonomia, no final do Século XIX e, mais recentemente, quando obtiveram o êxito, em 1976.
O Hino é o mesmo, a diferença está no ritmo, bem mais lento em Bom Jesus, possivelmente, pelo fato de, aqui, o Hino ser tocado e cantado nas procissões, o que não ocorre nos Açores, onde é tocado de forma vibrante - afinal, é o Hino de um “Estado”, do Império do Divino Espírito Santo - à saída dos Símbolos Sagrados da Igreja, da residência de quem os recebeu, ou, à chegada ou saída dos “Impérios”, pequenos prédios onde estes são guardados como objetos de culto e para as “Mudanças da Coroa”.
E, é importante notar e valorizar o fato de que Bom Jesus é o único lugar do Mundo em que este Hino continua a ser entoado com reverência ao Espírito Santo, à exceção, naturalmente, das Comunidades Açorianas espalhadas pelos diversos países e continentes, que levam consigo as suas fortes tradições para todos os lugares, sendo muito fácil, atualmente, vermos inúmeros vídeos onde se observa, com muita emoção, este traço marcante da cultura açoriana que herdamos.

4.2- A Entronização da Coroa nas casas

Esta foi uma outra boa novidade que o Pe. Mello acrescentou à nossa Festa, enriquecendo os laços de convivência, como se faz, até hoje, na sua terra de origem.
Antes, a Coroa, o Cetro e a Bandeira saíam em procissão da Igreja e voltavam para o mesmo local, onde havia ladainha, cânticos e Missa, sempre um Tríduo, começando na noite de 12 de Agosto e, tendo o dia 15 como o dia máximo da Festa.
Com a novidade, o Pe. Mello fazia um sorteio, muito concorrido, para a visita dos Símbolos Sagrados, que passavam a ficar, então, na casa dos sorteados por um dia, com  reza do terço e outras orações que se faziam em família e amigos mais chegados.
A novidade foi muito bem acolhida pelo povo, criando uma nova motivação para a Festa, com todos querendo ser agraciados com a visita da Coroa, Cetro e Bandeira do Divino Espírito Santo.

4.3- A Coroação

Este, ainda, é um ponto controverso na história da nossa Festa, pois, esta, ao ser retomada, em 1983, portanto, 27 anos depois de sua interrupção, ninguém se lembrava de como se fazia, porém, este é o ponto central da Devoção ao Espírito Santo nos Açores e o Pe. Mello, certamente, não deixaria de fazê-la, ou seja, de fazer a imposição da Coroa sobre a cabeça do “coroado”, enquanto, o mesmo, segura o Cetro, após beijá-lo.

O Sr. Elcio Xavier, do alto de seus 96 anos bem vividos e de memória extraordinária, antigo coroinha do Pe. Mello, afirma se lembrar, perfeitamente, deste momento essencial e solene.
Há 2 anos, houve a reintrodução deste costume, muito tradicional, em nossa Festa, onde foram coroadas 3 sobrinhas, ainda vivas à época do 1º Imperador, Pedro Teixeira Reis, bem como do último Imperador escolhido pelo Pe. Mello, no ano de sua morte, 1947, Orlando Batista de Oliveira Silva.


5º Ponto – A retomada da Festa em 1983

Depois de um longo período (27 anos) de interrupção da Festa, em 1983, por intervenção feliz do Padre, hoje, Monsenhor Paulo Pedro Seródio Garcia, que se lembrou da antiga Devoção, a Festa foi retomada e segue ininterrupta até os dias atuais.

6º Ponto – Conclusão

A Festa, em Bom Jesus, lembra a sua 1ª e mais antiga Devoção, a do Divino Espírito Santo e, tem componentes riquíssimos e, talvez, a única do Mundo a conter aspectos que, reunidos, a conservam como, quem sabe, a mais bonita, pois tem elementos da época mais remota, ainda de Portugal Continental, das suas origens, pelos idos de 1320, pela promessa de Santa Isabel, Rainha de Portugal, bem como elementos da mais genuína cultura e tradição das Ilhas Açorianas e, também, do Brasil, onde, até mesmo o “Imperador” Pedro I foi aconselhado a tomar este Título, em vez do usual “Rei” devido às Festas do “Império” do Divino Espírito Santo, mas, estas são outras Histórias que ficam para ser comentadas em outra oportunidade.



Bom Jesus, 18/07/2016












O último Imperador escolhido por Pe. Mello, que morreu durante a Festa de Agosto desse ano (13/08), como desejava, com ordens expressas de que a Festa deveria continuar, mesmo se viesse a falecer






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