O golpe militar de 64 causou um dano irreparável ao município de Bom Jesus do Itabapoana. Nessa ocasião, era governador do Estado do Rio de Janeiro o bonjesuense Badger Silveira, irmão do ex-governador Roberto Silveira, morto em acidente aéreo em 1961.
Mais precisamente, no dia 18
de março de 1964, cerca de 13 dias antes do golpe, o presidente João Goulart, o Jango, tinha agendado uma visita a
Bom Jesus do Itabapoana, em companhia do governador de
Badger Silveira, para assinarem o termo de compromisso da construção da Usina de Rosal.
Referida obra era considerada a redenção econômica da
região, uma vez que traria grande desenvolvimento para o município. A energia ali gerada seria
utilizada para a implantação de um pólo industrial na região do Vale do
Itabapoana.
Na edição de 15 de março de 1964, O Norte Fluminense
anunciava o depoimento eufórico de Badger a respeito da Usina de Rosal:
"Dentro de poucos anos as forças estutantes de nossas cachoeiras estará
transformando (sic) em energia elétrica que irá dinamizar o nosso progresso
através da eletrificação rural e do acionamento do parque industrial que
surgirá neste ubérrimo Vale do Itabapoana".
O COMÍCIO DAS REFORMAS
A mesma edição de O Norte Fluminense salientava, também, em sua primeira página, o "Comício das Reformas", ocorrido no dia 13 de março, ressaltando o apoio de Badger a Jango.
João Goulart discursou para cerca de 220 mil pessoas. O Norte Fluminense transcreve uma parte de seu discurso:
" Trabalhadores, acabei de assinar o decreto da SUPRA. Assinei-o, meus patriotas, com o pensamento voltado para a trajetória de irmãos brasileiros que sofrem no interior de nossa pátria. Ainda não é aquela reforma agrária pela qual lutamos. Ainda não é a reformulação de nosso panorama rural empobrecido. Ainda não é a carta de alforria do camponês abandonado. Mas o primeiro passo: uma porta que se abre à solução definitiva da melhoria agrária brasileira.
Chegou-se a proclamar, trabalhadores brasileiros, que esta concentração seria um ato atentatório ao regime democrático, como se no Brasil a reação ainda fosse dona da democracia ou proprietária das praças e das ruas.
Desgraçada a democracia a que tivera de ser desenhada por esses democratas. Democracia para eles não é regime de liberdade de reunião para o povo. O que eles querem é uma democracia de um povo emudecido, de um povo abalado nos seus anseios, de um povo abafado nas suas reivindicações. A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia do antipovo, a democracia da anti-reforma, a democracia do anti-sindicato, ou seja, aquela que melhor atenda aos seus interesses ou aos dos grupos que eles representam. A democracia que eles pretendem é a democracia do privilégio, a democracia da intolerância e do ódio...".
Badger também fez uso da palavra:
" Aqui está a própria consciência do povo brasileiro para dizer ao Presidente João Goulart que todo o povo respondeu que desejava que viessem as reformas de base imediatamente, reformas pelas quais o povo reclama e anseia.
Não podemos assistir de braços cruzados a fome, a falta de assistência médica, a falta de escolas. A bandeira da reforma está diante de Vossa Excelência, Presidente. Aqui está o clamor do povo, para que aqueles que não entenderam a realidade venham aqui, em contato com essa multidão, sentir que pacificamente a grande maioria do povo fluminense veio trazer sua confiança a Vossa Excelência".
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O bonjesuense Badger Silveira, governador do Estado do Rio de Janeiro, por ocasião do golpe militar de 1964 |
O ambiente de caos gerado pelas forças golpistas, contudo, culminou no dia de 31 de março de 1964 com a deposição do presidente João Goulart.
No dia 1o. de maio seguinte, golpistas inseridos na Secretaria de Segurança encaminharam à Assembleia Legislativa documentos acusando o governador Badger Silveira e seu vice, João Baptista da Costa, de terem "ligações com o Partido Comunista".
Em decorrência disso, os deputados pusilânimes acabaram decretando o impedimento de ambos para exercerem o cargo e impondo a perda dos direitos políticos a Badger Silveira por 10 anos, impedindo que este desse continuidade às obras previstas em favor do Estado do Rio de Janeiro e de Bom Jesus do Itabapoana.
Em relação ao "impeachment" de Badger, O Norte Fluminense pontuou nas páginas da edição de 3 de maio de 1964: "a cassação de seus direitos políticos teve dolorosa repercussão neste município, sua terra natal, onde desfruta de geral estima".
Com o golpe militar, o iminente desenvolvimento econômico e social de Bom Jesus do Itabapoana foi ceifado de modo truculento e vil.
A construção da Usina de Rosal, por exemplo, só foi concretizada mais de três décadas depois, mas com uma dimensão pífia: a Usina de Rosal e as Pequenas Usinas Hidrelétricas PCH de Pirapetinga, PCH de Calheiros e PCH Franco Amaral funcionam sem nenhum compromisso com o desenvolvimento da região. São administradas por empresas com índole privada mais interessadas no lucro do que servirem à região e à população.
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Usina de Rosal é administrada pela CEMIG |
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PCH Franco Amaral |
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PCH Calheiros |
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PCH Pirapetinga |
Como resultado disso, Bom Jesus do Itabapoana vive a ironia de estar sempre envolta com apagões, enquanto a riqueza oriunda das quedas das suas águas é apropriada pelo setor privado, em detrimento do nosso povo.