Da Série Entrevistas de O Norte Fluminense
Helton de Oliveira Almeida
Helton de Oliveira Almeida, conhecido como Heltinho, nasceu em Bom Jesus do Itabapoana, no dia 11/05/1929.
Seu pai, José Tarouquela de Almeida, nasceu em São Domingos, hoje distrito de Aré, Itaperuna (RJ), e teve quatro filhos: Dalton, Hélvio, Maria José e Ildes. Sua mãe se chamava Benedita Tarouquela.
Diante da situação de crise econômica pela qual passava São Domingos, José Tarouquela resolveu mudar-se para Bom Jesus com dois irmãos: Catão Tarouquela de Almeida e Ernani Tarouquela de Almeida. Adquiriu, então, uma chácara, em 1923, onde está localizado atualmente o Espaço Cultural Luciano Bastos. Ali, já existia uma casa, que, posteriormente, "foi modificada um pouco, para que fossem instaladas as dependências do Colégio Rio Branco, que funcionava em outro endereço. "Meu pai só vivia para a família, não se associando a nada. Ele vivia na roça, mas gostava mesmo é de mexer nas máquinas. Foi fornecedor de madeira, através de carros de boi, para a estação de trem em São Domingos. Ele ficava impressionado com o telégrafo da estação. Posteriormente, passou a ser o operador do mesmo", relata Heltinho.
Prossegue Heltinho: "Em Bom Jesus, a vocação pelas máquinas continuou forte e resolveu vender a chácara para comprar uma máquina francesa Alauzet de propriedade de Tebas Ananias, de São José do Calçado (ES), em 1925: "Esta máquina estava desmontada e foi o italiano Vitório Cassamali, um ferreiro, que, curioso, ajudou a montá-la em Bom Jesus. Uma vez recomposta a máquina, meu pai uniu-se a Osório Carneiro, que era meu padrinho e Delegado de Polícia, e que gostava de escrever. Assim, montaram uma gráfica e o jornal A Voz do Povo. A sociedade era informal: meu pai prestava serviço a Osório Carneiro para que fosse confeccionado o jornal.
"Posteriormente, meu pai adquiriu tipos da Tipografia Helena, da família de Joel Vasconcelos, que havia em Bom Jesus do Norte (ES) e se encontrava fechada. A gráfica foi estabelecida, no início, num prédio localizado próximo à Praça Governador Portela, e pertencia à família Teixeira. Meu pai alugou cômodos grandes até 1928. Posteriormente, ele construiu uma casa em frente à Relojoaria do Joaquim. A partir daí, foi fundada a firma Irmãos Tarouquela, com a gráfica funcionando num galpão, ao lado da residência. O nome fantasia da firma era Tipografia Almeida. Em seguida, A Voz do Povo passou a funcionar em 1930 onde era a Gráfica Guntenberg".
Houve um período, contudo, em que "Ésio Bastos e Jorge Pereira Pinto compraram a casa e a gráfica, tendo Esio fundado o jornal O Norte Fluminense. Esio passou também a imprimir A Voz do Povo para Osório Carneiro, que, mais para frente, adquiriu a máquina Marinoni, passando a estabelecer uma gráfica na Praça Governador Portela.Com a venda da gráfica em Bom Jesus, meu pai acabou mudando-se para Niterói, onde estabeleceu outra gráfica, na rua Barão do Amazonas. Ocorre que o negócio não deu certo, Dalton tomou outro rumo e acabaram vendendo a gráfica. Retornamos a Bom Jesus e montamos outra tipografia, restabelecendo a Irmãos Almeida, com Dalton e Hélvio. Como na época o jogo do bicho era aberto, passamos a imprimir talões de bicho para a 'Mina de Ouro' que chegou a e encomendar 100 talões. Posteriormente, com o desenvolvimento da nossa gráfica, passamos a fabricar cadernos. Chegamos a ter 48 empregados. Só admitíamos moças como funcionárias, em geral indicadas por um pastor".
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Heltinho e o reencontro com a máquina francesa Alauzet, do século XIX, no Espaço Cultural Luciano Bastos |
Segundo Heltinho, "chegamos a vender cadernos para 20 prefeituras. Fazíamos cadernos com as capas dos prefeitos. Chegamos a vender 100 mil cadernos para Duque de Caxias. Era a época da offset. Passamos a fazer, também, a editoração de livros. Chegamos a estabelecer um escritório em Campos dos Goytacazes (RJ), mas a concorrência passou a pressionar para que não participássemos das licitações. Além disso, "a prefeitura de Campos dos Goytacazes queria que pagássemos ISS em Campos e não em Bom Jesus. O fato é que a chegada, no mercado, do caderno universitário acabou com a nossa fábrica de cadernos. Não pudemos concorrer com as grandes fábricas. As capas dos cadernos influenciavam os alunos.
"Eu era sócio majoritário da firma e, depois, deixei a direção com meu filho Guilherme. Eu é que fazia a estatística e o balanço todo o mês. Era meu trabalho. Com o falecimento de Guilherme e o inventário, saí da empresa e deixei a direção com meu genro, que preferiu, depois, acabar com a firma, há cerca de 4 anos. Vendi o prédio, mas até hoje estou pagando dívidas da firma", acentua.
Helton Almeida é casado com Gláucia Figueiredo Almeida, de Rosal, e teve 4 filhos: Glícia, Guilherme, Gláucia e Hélcia. Ao final da entrevista, ocorrida no dia de seu aniversário, recorda, emocionado, do falecimento de Guilherme e Hélcia, e diz que "não há como descrever a dor da perda de um filho. É como se eu estivesse vivendo um filme em preto e branco e não mais colorido. O que eu mais desejaria neste dia de meu aniversário, é ter todos os filhos juntos de mim". Em seguida, aponta para uma poesia que está fixada em uma parede, e que escreveu em homenagem a Guiherme, no dia 31 de dezembro de 1996.
Heltinho e Gláucia
CASTELO NA AREIA
Ao saudoso filho José Guilherme
Nossa vida é um castelo
Nas areias modelada
Para a nossa vista tão belo!
Em nossas mãos foi formado!
Não previmos que num lance
As ondas do mar avançassem
Na dura realidade
Este castelo erguido
Foi assim destruído
Restando só a saudade.
Helton leva, então, a reportagem de O Norte Fluminense para um cômodo no subsolo de sua casa e diz: "quando acabei com a gráfica, pensei: 'vou levar uma lembrança dela' ". Assim, trouxe para este cômodo a máquina de cortar papel, uma guilhotina manual e uma prensa. "Hoje, compro papéis, faço bloquinhos e distribuo para as pessoas", assinala.
Heltinho, no cômodo de sua casa, onde se pode dizer que estabeleceu uma pequena gráfica, revive a cada momento a trajetória que seu pai iniciou um dia em Bom Jesus do Itabapoana, que ele próprio soube recomeçar, e que seu filho Guilherme levou adiante até o fim de sua vida. Trajetória repleta de frutos, como atestam os jornais bonjesuenses que perseveram até hoje: A VOZ DO POVO e O NORTE FLUMINENSE.
Heltinho e a recordação de sua gráfica