domingo, 5 de outubro de 2025

Entre Açores e Itabapoana: O Jornal O Norte Fluminense, a Ponte de Francisco e a Banca do Rodolfo





A Ponte Invisível de Francisco e o Sonho de Ésio: Como um jornal bonjesuense cruzou mares e gerações para chegar ao coração do Rio de Janeiro

Quando Ésio Bastos fundou o jornal O Norte Fluminense, em 25 de dezembro de 1946, talvez não imaginasse que, setenta e nove anos depois, o jornal bonjesuense não apenas continuaria ativo, mas que seus exemplares se tornariam objeto de interesse de cariocas, a ponto de serem expostos na tradicional Banca do Rodolfo, na Rua Conde Bonfim, na Tijuca, bairro emblemático do Rio de Janeiro.

Tudo aconteceu de forma espontânea, como costumam acontecer as coisas movidas pela amizade e pela cultura.

O açoriano Francisco Amaro Borba Gonçalves, inspirado pelo legado de seu conterrâneo Padre Antônio Francisco de Mello, visitou Bom Jesus do Itabapoana e conheceu o O Norte Fluminense. Encantou-se com a missão do jornal: resgatar a história local e divulgar as atividades culturais invisíveis à grande mídia.

Ao ler sobre a açorianidade bonjesuense, Francisco percebeu um laço natural com a açorianidade carioca, representada pela Casa dos Açores do Rio de Janeiro, a primeira do Brasil, também situada na Tijuca.

Foi então que surgiu a conexão inesperada: Rodolfo, descendente de italianos e sogro de João Leonardo Soares, presidente da Casa dos Açores, encantou-se com o conteúdo do jornal e decidiu expor suas edições em sua banca.

Francisco tornou-se, assim, ponte viva entre Bom Jesus do Itabapoana, a Tijuca e o Rio de Janeiro, entre memórias e futuros possíveis.

 Frutos da ponte

O gesto simbólico não demorou a frutificar.

O O Norte Fluminense recebeu uma mensagem emocionada do professor e historiador Lincoln Penna, doutor pela USP e conferencista honorário do Real Gabinete Português de Leitura:

“Como professor e historiador quero parabenizar O Norte Fluminense pela matéria alusiva ao amigo jornaleiro Rodolfo, que transformou sua banca de jornais na Tijuca num espaço de leitores ávidos de novidades. Rodolfo é um exemplo de como divulgar a literatura e a cultura livresca. Merece todo incentivo e aplauso.”

A ponte de Francisco, portanto, não uniu apenas duas cidades, mas também duas gerações de sonhadores, dois tempos e dois modos de celebrar a cultura.

No dia 4 de outubro, Rodolfo e Francisco Amaro Borba Gonçalves receberam uma comitiva bonjesuense que levou a edição de setembro do jornal, blusas do jornal O Norte Fluminense, uma coleção de livros e discos representando o talento local:

Gino Martins Borges Bastos, André Luiz de Oliveira, Paulino José Rocha da Silva e Isac Nascimento, da TV Alcance.

Entre as obras entregues à banca estavam livros sobre Padre Mello, Elcio Xavier, o Príncipe dos Poetas, Gedália Loureiro Xavier, a Princesa das Poetisas, Deltan de Mattos, além de edições do antigo jornal Itabapoana, dirigido pelo campista Sylvio Fontoura, e CDs de músicas bonjesuenses, incluindo uma composição do próprio Francisco Amaro, interpretada magistralmente por ele.

A Banca do Rodolfo tornou-se, assim, um altar de cultura e memória, acolhendo a prosa, a poesia, a música e a história de Bom Jesus do Itabapoana, e fortalecendo os laços literários entre o interior e a capital.

 Ecos de gratidão e eternidade

Na ocasião, Lincoln Penna fez questão de comparecer e doou quatro de seus consagrados livros, Memórias Confinadas, Qual República Queremos, O Suicídio de Vargas e Brasil Século XXI: na Expectativa da Revolução Social e Ambiental.

Um transeunte, ao ouvir seu nome, aproximou-se e prestou um depoimento espontâneo à TV Alcance, relembrando o Mestre inesquecível.

Tudo aconteceu sem cerimônia, sem ensaio, com a naturalidade dos momentos verdadeiros que brilham por si próprios.

Os frutos de Ésio Bastos, dos antepassados açorianos, italianos e bonjesuenses, talvez jamais imaginassem que floresceria um instante como este: um encontro entre passado e futuro, entre chegada e partida, entre memória e sonho.

Vozes que ecoam

Padre Mello, em seu poema Vitória do Gênio, imaginou Camões erguendo-se do túmulo para saudar os heróis Sacadura Cabral e Gago Coutinho:

"Prossegui, meus irmãos! A Providência

na vida histórica dos povos traça

as linhas principais. Sois a sequência

dos bons representantes desta raça.

Pedro Álvares e Gama abriram mares,

vós um novo caminho abris nos ares".


Hoje, talvez, Padre Mello inspirasse os açorianos, os bonjesuenses e os cariocas com novos versos:


 “Que a cultura vos seja a vela acesa,

que o saber vos conduza à claridade,

e que o labor, com arte e com nobreza,

faça do hoje um hino à eternidade.”


Notas biográficas

Ésio Bastos. Jornalista e fundador de O Norte Fluminense (1946), símbolo do jornalismo cultural e comunitário de Bom Jesus do Itabapoana.

Padre Antônio Francisco de Mello. Poeta açoriano, autor de Vitória do Gênio, que exalta a herança portuguesa e os feitos da cultura lusófona.

Lincoln Penna.Doutor em História pela USP, professor aposentado da UFRJ, conferencista do Real Gabinete Português de Leitura, autor de obras consagradas sobre história política e social do Brasil.

Francisco Amaro Borba Gonçalves. Idealizador da ponte cultural entre Bom Jesus do Itabapoana e o Rio de Janeiro, é poeta, escritor, memorialista, compositor e cantor, tal como seu conterrâneo Padre Antônio Francisco de Mello, a quem dá prosseguimento na sua grande obra cultural.

Rodolfo. Jornaleiro tijucano, descendente de italianos, responsável por transformar sua banca em espaço de leitura e de celebração da cultura.



 





 













 


 


 


 



 


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