quarta-feira, 15 de setembro de 2021

MEU RIO ITABAPOANA

Do Grito ao Silêncio

                 

           Zacarias de Matos Sarlo  


 

Não ouviram os meus gritos

Nem das corredeiras os bramidos;

Também não leram os escritos

Dos majestosos tempos idos.


Não perceberam o meu silêncio

Que anunciava a decadência,

Quando já sem oxigênio

Esvaía-se a vida que em mim havia.


Enviei avisos, mandei sinais

Revelei meu enfado e cansaço;

Mas nas correntezas da vida

Jamais se ouviu os gemidos do meu regaço.


Trouxe à memória os mergulhos,

Pescarias de lagostas nas aragens;

Os encantos de tanto barulho

Das aves se aninhando às margens.


Hoje, fadado ao relento,

Dos tempos de glória, só verso;

Meu leito apodrecido e nojento,

Segue entre as margens do progresso.


Os que outrora tanto enalteciam

A vida que em mim pulsava

Suas canoas desfilavam;

Oh! Quanta vida em meu leito remava.                                                                       

                               

Aqueles hoje falam: filho não entre;

É um rio sem alma e poluído,

Tudo que sai do seu ventre,

É detrito e mau cheiro doído.


Hoje, porém, todos me ouviram;

Extravasei-me, abandonei o meu curso;

Cresci, inundei como nunca olhos viram;

Medo e pavor era o único discurso.


Quero que saibam apenas,

Não é vingança nem fúria;

Tantos óleos, garrafas e camas,

Como carregar tanta agrura!


Alcancei campinas, orgulhos e aldeias;

Desnudei vaidades, destruí mobílias;

Vidas não ceifei, deixo a luz das candeias;

Pra guiar o novo após as vigílias.


Abra Deus as comportas do trono da graça;

Jorre as mais ricas bênçãos e salvação eterna;

Flua o renovo, o progresso, a bonança;

Vida nova brote à orla do RIO ITABAPOANA.

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