Do Grito ao Silêncio
Zacarias de Matos Sarlo
Não ouviram os meus gritos
Nem das corredeiras os bramidos;
Também não leram os escritos
Dos majestosos tempos idos.
Não perceberam o meu silêncio
Que anunciava a decadência,
Quando já sem oxigênio
Esvaía-se a vida que em mim havia.
Enviei avisos, mandei sinais
Revelei meu enfado e cansaço;
Mas nas correntezas da vida
Jamais se ouviu os gemidos do meu regaço.
Trouxe à memória os mergulhos,
Pescarias de lagostas nas aragens;
Os encantos de tanto barulho
Das aves se aninhando às margens.
Hoje, fadado ao relento,
Dos tempos de glória, só verso;
Meu leito apodrecido e nojento,
Segue entre as margens do progresso.
Os que outrora tanto enalteciam
A vida que em mim pulsava
Suas canoas desfilavam;
Oh! Quanta vida em meu leito remava.
Aqueles hoje falam: filho não entre;
É um rio sem alma e poluído,
Tudo que sai do seu ventre,
É detrito e mau cheiro doído.
Hoje, porém, todos me ouviram;
Extravasei-me, abandonei o meu curso;
Cresci, inundei como nunca olhos viram;
Medo e pavor era o único discurso.
Quero que saibam apenas,
Não é vingança nem fúria;
Tantos óleos, garrafas e camas,
Como carregar tanta agrura!
Alcancei campinas, orgulhos e aldeias;
Desnudei vaidades, destruí mobílias;
Vidas não ceifei, deixo a luz das candeias;
Pra guiar o novo após as vigílias.
Abra Deus as comportas do trono da graça;
Jorre as mais ricas bênçãos e salvação eterna;
Flua o renovo, o progresso, a bonança;
Vida nova brote à orla do RIO ITABAPOANA.
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