No dia 2 de setembro passado, ocorreu, no Salão da Câmara de Vereadores, localizado no Edifício Vereador Esio Bastos, mais uma sessão histórica do ILA (Instituto de Letras e Artes Dr José Ronaldo do Canto Cyrillo), para celebrar os 27 anos de existência da arcádia, que ocorreu no dia 11 de agosto, e relembrar os 75 anos de falecimento de Padre Mello.
O ILA
Foi a Dra Nisia Campos quem levou, no segundo semestre de 1994, a ideia da criação do Instituto ao Dr. Ayrthon Borges Seródio, presidente do Conselho Municipal de Cultura, que a aprovou. Na época, o prefeito era Álvaro Moreira, que também apoiou o projeto. O sonho de Dra Nisia se concretizou no dia 11 de agosto de 1995.
As reuniões iniciais ocorreram no Anfiteatro Iracema Seródio Boechat, localizado na Prefeitura Municipal. Posteriormente, passaram a ocorrer nas dependências do Colégio Rio Branco e, atualmente, sucedem no salão da Câmara Municipal.
Desde que assumiu a presidência do ILA, Dra Nísia vem imprimindo um grande dinamismo à entidade, promovendo sessões históricas, concursos de poesias para estudantes e lançamentos de livros, entre outros eventos meritórios.
A entidade sempre se dedicou a forjar melhores seres humanos e promover a consolidação da identidade cultural, como restou exemplarmente delineado por ocasião da sessão solene do dia 2 de setembro.
Três escolas estiveram presentes à solenidade e tiveram suas histórias narradas pela Dra Nisia. Os educandários brilharam com seus alunos declamando poesias: o Colégio Estadual Roberto Silveira, o Colégio Estadual Padre Mello e o Centro Educacional Santa Rita de Cássia que, além da comitiva, se fez presente com dois professores que são autores de livros infantis, Daiane Ricardo e Rônei Sabóia.
O momento de oração esteve sob a responsabilidade do músico Thadeu Almeida, presidente do Conselho Municipal de Política Cultural e Doutorando em Música pela UFRJ, que se emocionou ao lembrar de sua mãe. Em seguida, as jovens Lara Garcia e Letícia Pillar, alunas de Thadeu Almeida, na Escola de Música MusicArt, entoaram a canção "Nada te perturbe", de autoria de Ir. Míria T. Kolling, acompanhadas pelo mestre, ao teclado.
A cantora Maria Lúcia Bastos Borges brindou o público com o belo fado "Foi Deus", de Amália Rodrigues, acompanhada da consagrada musicista Ana Maria Teixeira Baptista
O hino do Colégio Estadual Padre Mello, por sua vez, foi cantado por Marisa Teixeira Valinho, acompanhada também por Ana Maria Teixeira Baptista. Deve ser registrado que foi Marisa Valinho quem musicou o poema de Padre Mello, "Morrer Sonhando" - que se tornou o hino do educandário - a pedido de seu pai, Luizinho Teixeira, no dia 27 de abril de 1967, em homenagem aos 104 anos de nascimento do pároco açoriano.
Neusa Maria Nunes leu texto de Maria Margareth Salvatti sobre a origem do ILA, enquanto Evandro Francisco Vargas discorreu sobre a vida de Padre Mello.
Cláudio Figueiral Ribeiro, filho do saudoso médico e músico Jayme Figueiral, representou o prefeito Paulo Sérgio Cyrillo, enquanto o memorialista Dr Antônio Borges Soares representou o pároco Rodrigo Mello.
Marcaram presença, ainda, as membras do ILA, Elma Cardoso, Cláudia, Profa. Maria Áurea Carneiro e a artista plástica Izabel Borges, o Dr. Auler Carneiro Ribeiro, da FAMESC, o músico Samuel Xavier, filho do consagrado músico e autor do hino do ILA, Samuel Xavier, Dr. José Antônio Rangel, Administrador Distrital, Mariângela Lima, membra da UFES, Sargento Bartholazzi, Comandante do Tiro de Guerra, Regina Lúcia Goulart, secretária do jornal A Voz do Povo, Gino Bastos, do jornal O Norte Fluminense e Maria Teresinha do Carmo Oliveira, mãe do Ir Ederaldo do Carmo, sobrinho-bisneto de Padre Mello e o médico Dr Paulo Salim, entre outros.
Os 75 anos de falecimento de Padre Mello
Por ocasião da memória dos 75 anos de falecimento de Padre Mello, esteve presente Maria Teresinha do Carmo Oliveira, mãe do Ir. Ederaldo do Carmo, sobrinho-trineto do pároco açoriano. Ela é filha de Maria Irinéia do Carmo Mello, que, por sua vez, é filha de Manoel Raposo, sobrinho de Padre Mello. Maria Irinéia é quem cozinhava e lavava roupas para o ilustre tio, quando este morava na antiga casa da Avenida Padre Mello.
Segundo Teresinha, "Padre Mello era tudo para Ederaldo. Tenho dois netos, filhos do também saudoso Eduardo: 'Cristian e Igor Borgatti do Carmo'.
Dra Nisia resgatou um fato histórico, quando Padre Mello resolveu unir as ruas 15 de Novembro e Abreu Lima (homenagem a Leônidas Peixoto de Abreu Lima). A população resolveu dar o nome à via, de Avenida Padre Mello, o que teria contrariado o pároco, que, contudo, acabou cedendo diante da pressão popular capitaneada por Sylvio Fontoura, diretor do primeiro jornal de Bom Jesus, "Itabapoana", fundado em 1o./08/1906.
Padre Mello, um gênio da Cultura e da Civilização, nasceu no dia 27 de abril de 1863, na localidade de Achada Grande, ilha de São Miguel, Arquipélago de Açores, Portugal. Estudou no seminário da ilha Terceira, sendo ordenado no dia 24 de agosto de 1888. Na ilha de São Miguel, publicou livros e escrevia para jornal. Veio para o Brasil em 1895, onde foi vigário em Sapucaia (RJ). No dia 18 de junho de 1899, veio para Bom Jesus do Itabapoana, onde viveu por quase meio século, falecendo às 13h 30min do dia 13 de agosto de 1947.
Padre Mello foi escritor, poeta, redator dos jornais, "A Paróquia", "O Norte" e "Meu Campinho", além de ser o responsável pelos registros de propriedades em nossa região. Foi também músico e compositor, sendo o autor do hino do antigo Colégio Rio Branco, do qual foi professor. Além disso, era conhecedor de técnicas de engenharia, tendo construído a parte externa da majestosa Igreja Matriz da Paróquia Senhor Bom Jesus, fixando em nossa praça principal todo o esplendor arquitetônico português, além de orientar na construção de prédios e estradas. Possuía conhecimento dos métodos de plantação de café, razão pela qual promoveu a orientação no cultivo do mesmo. Foi, ainda, ativista político na luta pela segunda emancipação de nosso município, ocorrida em 1º/01/1939. Faleceu às 13 h do dia 13 de agosto de 1947.
Por ocasião da solenidade, três grandes poesias de Padre Mello foram levadas ao público. Duas foram declamadas por alunos: "Flor de Luz" e "Bom Jesus do Itabapoana". A terceira, "Morrer Sonhando", constitui poema musicado e transformado em hino do Colégio Estadual Padre Mello. O Norte Fluminense publica as mesmas, a seguir.
FLOR DE LUZ
Há uma flor que desponta
De noite, na escuridão,
Uma flor que assim que nasce
Logo é flor sem ser botão.
Flor que metálico fio
Em um momento produz,
Flor que o tato não encontra,
Flor do éter, flor da luz.
Por pétalas tem mil raios,
Por seiva a eletricidade,
Por corola a chama viva,
Por perfume a claridade.
Flor que à noite a lua inveja
E que o sol invejaria
Se por ventura em seu trono
Pudesse vê-la de dia.
Mas nasce quando o sol morre
E morre quando o sol nasce,
E se ressurge de dia
E onde o sol não transpasse.
Vós que viveis nas montanhas,
Quereis a glória da luz?
Vinde passear à noite
Nas ruas de Bom Jesus.
BOM JESUS DO ITABAPOANA
Poetas e prosadores
Tem cantado os teus primores,
Ó terra de Bom Jesus.
E no entanto minha lira,
Calada apenas admira
Quem teus encantos traduz.
Na asa do verso ou da prosa
Tua lama gloriosa
Vai percorrendo o Brasil
Tecendo igual elogio
A gente, aos montes, ao rio,
Ao teu aspecto gentil.
E as águas do Itabapoana
Que vem de além da Caiana
Do alto Caparaó,
Vão dizendo: "Lugar lindo
Dos que vamos refletindo
E só Bom Jesus, é só."
E quem vem de toda parte
Ante a natureza e a arte
E os monumentos de fé
Murmuram: "Terra tão linda,
Ser um arraial ainda
É mais que injusto. Não é?
Se de vila tem o nome
Quem haverá que o não tome
Por tapeação? Não há.
Terra assim para servi-la
Não é bastante ser vila,
Mais do que vila será."
Fala assim quem vem de fora,
Como falará quem mora
Dentro de ti, Bom Jesus?
Vais vivendo de esperança
Mas tua gente já cansa
Sem ver surgir uma luz.
Uma luz que os céus aclare
E após a aurora depare
O sol da Libertação.
E diriam com verdade:
"Bom Jesus já é cidade,
E mais que justo, pois não?"
MORRER SONHANDO
Cedo, bem cedo, perderei a vida,
planta ferida no mimoso pé.
Teu desengano perecer me ordena,
na idade plena de esperança e fé.
Porém a morte, me é suave e doce
como se fosse uma ilusão de amor;
embora eu sinta que uma luz se apaga
outra me afaga de eternal fulgor.
Morrer sonhando! Como é doce a morte!
Que vale a sorte que esta vida tem?!
A vida é sempre uma fugaz mentira,
a morte aspira a realidade além.
Morre este corpo de servil matéria,
baixa à miséria de funéreo pó,
porém minha alma sempre viva sonha
vida risonha não mereço dó.
Beijo-te a mão que me assassina e creio
que ela veio me libertar ao fim.
Morrer sonhando é despertar na glória;
eis a vitória! Morrerei assim.
Relíquia de Padre Mello é apresentada pelo memorialista Dr Antônio Soares Borges
O memorialista Dr Antonio Soares Borges apresentou, na sessão do ILA, uma raridade: um livreto de Padre Mello datado de 1890 - época de nossa primeira emancipação - intitulado "O Padre", editado dois anos após sua ordenação, ocorrida na ilha Terceira, Arquipélago dos Açores. Entre os inúmeros versos que se destacam, estão os seguintes:
"Contra o insulto vil tens o perdão nos lábios
mas se ofendida for a fé por pseudos sábios,
tens a arma da Ciência e tens da graça o forte."
O livreto foi impresso pela 'Typographia Popular", localizada na "Rua da Canada", em Ponta Delgada, ilha de São Miguel, e constitui a mais antiga obra de Padre Mello, em nosso município. A publicação foi localizada em um sebo de Juiz de Fora (MG).
A razão dessa relíquia ter sido localizada nessa cidade mineira, se explica pelo fato de Padre Mello ter estado em Juiz de Fora, em setembro de 1903, ocasião em que lhe dedicou a poesia "Grata Impressão", que segue.
Segundo Antonio Soares, ele entende que Padre Mello resolveu reeditar o livreto, em Bom Jesus, em 1932, por causa da " idêntica efervescência política também existente nos Açores". Seria interessante termos, no futuro, uma análise sobre os elementos que Padre Mello modificou ou eliminou, assim como as novas criações realizadas 42 anos após a confecção da imponente poesia.
A título de informação, transcrevemos a apresentação do referido opúsculo realizada em Bom Jesus, no ano de 1932:
"Este poemeto nem é todo trabalho novo nem todo de outros tempos. É um misto de um e outro. Das ruínas do que surgiu em 1890 na ilha de S. Miguel, meu berço natal, empreguei elementos que julguei aproveitáveis, e dos mais, uns foram substituídos ou modificados e outros eliminados completamente. A par de tudo isso, algumas criações novas. E ai está a miscelânea que sob o titulo impresso no frontispício entrego ao juízo do público quanto a parte técnica e à censura de meu amadíssimo Prelado quanto à doutrina que estes versos implicam.
O assunto não fica esgotado; é muito mais extenso que a obra. Mas várias circunstâncias se opuseram a que lhe desse maior desenvolvimento.
Bom Jesus do Itabapoana, Agosto de 1932"
Como se verifica da noite do dia 2 de setembro, tratou-se de mais um momento que ficará marcado como um dos grandes acontecimentos de nossa cultura e história, comprovando que o ILA constitui sempre uma circunstância imprescindível para unir famílias, edificar jovens e cidadãos e celebrar o passado, assim como para sonhar e construir um futuro digno.
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Maria Teresinha do Carmo Oliveira, mãe do Ir Ederaldo do Carmo, sobrinha-neta de Padre Mello |
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Saudoso Ir Ederaldo do Carmo, sobrinho bisneto de Padre Mello, nascido em 21 de outubro de 1964, falecido a 13 de setembro de 2020 |
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Pe Mello, um gênio da Civilização e da Cultura |
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O memorialista Dr Antônio Soares Borges e a relíquia: livreto O Padre, editado por Padre Mello em 1890, na ilha de São Miguel, nos Açores |
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Daiane Ricardo apresentou seus livros |
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Rônei Sabóia também apresentou seus livros |
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Cláudio Figueiral Ribeiro, filho do saudoso médico e músico Jaime Figueiral |
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Samuel Xavier, filho do legendário músico Samuel Xavier
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Prof. Auler Carneiro, da FAMESC |
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Sgto Bartholazzi, Comandante do Tiro de Guerra |
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Ana Maria Teixeira Baptista, Thadeu Almeida e Marisa Teixeira Valinho: a nata da música bonjesuense
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